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13ª Bienal Internacional de Arquitetura de Veneza
29.08.2012 a 25.11.2012

por
Carlos Alberto Maciel

Um dos eventos mais importantes do calendário arquitetônico mundial, a 13ª Bienal Internacional de Arquitetura de Veneza acontece de 29 de agosto a 25 de novembro de 2012. Common Ground é o tema proposto pelo diretor deste edição, o arquiteto inglês David Chipperfield.

Da alta cultura às práticas cotidianas

Num campo, e esta é a lei geral dos campos, os detentores da posição dominante, os que têm maior capital específico, se opõem por uma série de meios aos entrantes (emprego de propósito esta metáfora emprestada da economia), recém-chegados, chegados-tarde, arrivistas que chegaram sem possuir muito capital específico. Os antigos possuem estratégias de conservação que têm por objetivo obter lucro do capital progressivamente acumulado. Os recém-chegados possuem estratégias de subversão orientadas para uma acumulação de capital específica que supõe uma inversão mais ou menos radical do quadro de valores, uma redefinição mais ou menos revolucionária dos princípios da produção e da apreciação dos produtos e, ao mesmo tempo, uma desvalorização do capital detido pelos dominantes.

Pierre Bordieu, Alta costura e alta cultura[1]

Common Ground, ou Solo Comum, é o tema da 13a Bienal de Arquitetura de Veneza. É, por um lado, um chamamento para uma discussão sobre o que nos aproxima, e não o que nos separa, segundo seu curador, o arquiteto britânico David Chipperfield. É, também, produto de um profissional cuja principal atuação ocorre no âmbito da “prática da arquitetura? como definiu Paolo Baratta, Presidente da Bienal. Se a Bienal de 2010, dirigida por Kazuo Sejima, apresentava um forte apelo ao público geral, sob o tema “People meet in architecture? a Bienal de Chipperfield propõe uma discussão interna ao campo.

Common Ground foi interpretado das mais variadas maneiras pelos arquitetos que tomaram parte nas diversas exposições, desde a mostra principal, realizada pelo curador, até as representações nacionais. Alguns buscaram nas estruturas ambientais típicas de cada país a representação de uma identidade local que estabelecesse uma experiência comum, compartilhável e fundadora das relações sociais. Esse foi o princípio que orientou a expografia do Chile, com a interpretação da Cancha ?um vazio originalmente destinado aos jogos, que funciona como um espaço aglutinador da vida social ?e do Kwait, cuja representação recria a Diwaniya ?um ambiente construído, aos modos de uma grande sala, que funciona no intervalo entre o espaço público e a casa como lugar de encontro dos homens, onde se discutem as principais questões da vida política e social do país.

Em vários casos, Common Ground foi interpretado como o solo comum, o território e o espaço público da cidade, locus privilegiado da ação dos arquitetos. Outra interpretação recorrente se pauta pela procura de um denominador comum na técnica, no detalhe e na realização material dos edifícios.

Contudo, cada uma dessas interpretações é não mais do que um desvio em relação à ideia central contida nas entrelinhas da proposta curatorial, seguramente à procura de uma demarcação do campo de ação dos arquitetos. É no sentido bourdiano da criação de “estratégias de conservação? especialmente em momentos de crise, que se constrói o argumento central de Chipperfield:

Common Ground nos provoca a admitir as inspirações e influências que eu acredito devem definir nossa profissão. A frase também chama nossa atenção para a cidade, que é nossa área de especialidade e atuação, mas é algo criado em colaboração com cada cidadão, e as várias partes interessadas e participantes do processo da construção. A disciplina da arquitetura envolve preocupações variadas e às vezes contraditórias, mas eu acredito que nós compartilhamos ideias e visões que podem se confirmar através da arquitetura. Common Ground nos convida a encontrar essas ideias compartilhadas a partir de nossas diferentes posições. [2]

A tentativa de demarcação do campo fica mais evidente na participação de Bernard Tschumi, ao diferenciar “arquitetura??feita ou eleita por arquitetos ?da mera construção. É compreensível que esse tipo de diferenciação tenha ocorrido, por exemplo, no contexto da arquitetura moderna brasileira, quando Lucio Costa, nos anos 40, distinguia a arquitetura de mera construção como forma de consolidar o campo profissional da arquitetura num momento ainda incipiente, diferenciando-o da atuação dos engenheiros e dos construtores.[3] No atual contexto diverso e complexo da produção da arquitetura e da discussão sobre as cidades, esse esforço soa um tanto anacrônico, um “lugar comum? (Fig. 1) As oposições apresentadas por Tschumi opõem original à cópia ?a Veneza italiana e a de Las Vegas -, o ordinário ao extraordinário ?o estacionamento helicoidal e o Museu Guggenheim – e elabora jogos de palavras na tentativa de delimitar o que poderia ser chamado de arquitetura.

São, contudo, diversas e qualificadas as abordagens que se contrapõem a esse lugar comum, discutindo questões contemporâneas e apontando caminhos para reinventar de modo mais humano e democrático a prática – ou as práticas – da arquitetura.

A alta cultura da construção (ou “Deus está nos detalhes?

Common Ground aparece ainda como o conhecimento técnico que viabiliza a construção, compartilhado entre os arquitetos. Esse sentido tectônico e material se revela na presença de arquitetos como Kenneth Frampton – que apresenta uma seleção de escritórios norte-americanos dedicados à arte de construir -,Hans Kollhoff ?que traz a discussão sobre o detalhe arquitetônico das wall sections dos edifícios por ele projetados na Alemanha -, Anupama Kondoo – indiana que reconstruiu no interior do Arsenale a Casa Muro ?Wall House -, originalmente construída em 2000 em Auroville, na India -, Paulo Mendes da Rocha (Fig.2) ?dialogando com o escritório irlandês Grafton Architects, premiado com o Leão de Prata.

Até mesmo a iraquiana Zaha Hadid comparece nessa bienal ao lado de um conjunto de obras, estudos e pesquisas sobre a concepção de cascas estruturais, advogando uma possível filiação entre o seu trabalho e o de arquitetos modernos como Eladio Dieste e Eero Saarinen.

É particularmente interessante nesse contexto a mostra de Toshiko Mori, apresentando um conjunto de projetos residenciais realizados por ela que se colocam em diálogo com a obra de grandes mestres como Ludwig Mies van der Rohe, Phillip Johnson, Frank Lloyd Wright e Paul Rudolph. Em alguns dos casos, trata-se de novas construções que se acrescentam a residências originalmente projetadas pelos arquitetos modernos. Em outros casos, trata-se de uma referência formal e construtiva, que reedita os princípios de organização do espaço e da construção, como no caso de Mies. Em todos os casos, as escolhas da arquiteta se fazem a partir do reconhecimento aprofundado da lógica construtiva dos edifícios referenciais, estabelecendo uma relação direta entre a nova construção e as pré-existentes até o nível do detalhe. Detalhes que são apresentados em maquetes na escala 1:2. (fig. 2) Trata-se, em última instância, de uma delicada relação que concilia técnica e história, investigando sobre a inserção de novos elementos junto a edifícios históricos. O próprio entendimento da arquitetura moderna como história permite à arquiteta um reposicionamento frente às questões contemporâneas e seu confronto com o passado, evitando o risco do pastiche. Não é coincidência que, em um debate denominado ?em>Dialogue on Details?– ou Diálogo sobre detalhes -, organizado pela arquiteta, ela tenha afirmado que nós, arquitetos, vivemos sob um duplo destino: a história e a gravidade. Talvez fosse possível acrescentar um terceiro e igualmente importante fato que condicionaria o fazer do arquiteto: o clima.

É contudo a presença de três grandes mestres daquilo que Frampton definira como “cultura construtiva?que finaliza, em grande estilo, esse elogio à alta cultura arquitetônica. Propositalmente apresentados no pequeno jardim existente ao final do percurso expositivo do Arsenale, três peças fundamentais exploram diferentes percepções do lugar. Dentro da torre escura que finaliza o percurso, um filme de Win Wenders sobre o arquiteto suiço Peter Zumthor revela um pouco do cotidiano do arquiteto em meio à produção de dois projetos recentes. No filme, Win Wenders conclui que a condição de trabalho e vida de Zumthor ?que escolhe fazer poucos projetos, aprofundando suas soluções sempre com o objetivo de criar espaços qualificados de forte expressão material que repercutam positivamente na vida de seus habitantes ?é um privilégio desejado por qualquer profissional, arquiteto ou não.

Do lado de fora, duas instalações projetadas pelos arquitetos portugueses Eduardo Souto de Moura e Álvaro Siza Vieira dialogam com diferentes paisagens. Souto de Moura conforma uma passagem para o jardim que mira o canal e ressalta a presença de alguns elementos do entorno (Fig. 3); Siza redesenha o jardim, outrora aberto, através de muros que recriam uma intimidade no espaço interiorizado, a lembrar Barragán. Ao introduzir um novo elemento no jardim, tensionado pela presença de três árvores que geram fendas e permitem entrever o lado de fora, mas também geram sombra, Siza faz arquitetura, mais do que uma simples intervenção artística: cria recintos, orienta percursos, redesenha a paisagem, recria o lugar (Fig.4) . A maestria tectônica é glorificada, nessa bienal, com a presença física da dupla portuguesa e com a transcendência de Zumthor, em que a matéria é apenas um meio para criar suportes memoráveis para a experiência cotidiana.

Riposatevi e Peep: a participação brasileira

Com curadoria de Lauro Cavalcanti, a participação brasileira na 13a Bienal de Arquitetura de Veneza traz uma cuidadosa mostra estruturada em dois polos: de um lado, a remontagem da instalação Riposatevi, de Lucio Costa, originalmente apresentada na 3a Trienal de Milão, em 1964; de outro lado, Peep, instalação de Márcio Kogan e Estudio MK27.

Se por um lado a apresentação da mostra busca pontos de contato entre as obras dos arquitetos através da conciliação entre uma linguagem moderna com técnicas e materiais interpretados de contextos tradicionais, por outro talvez o que sustenta a exposição é justamente o reconhecimento de suas diferenças: entre a obra pública de Lucio Costa e a produção do espaço doméstico de Kogan; entre o olhar para o futuro do Doutor Lucio, e a busca de referências na história ?no nosso caso, moderna ?do Estudio MK27; entre a tecnologia dos vídeos de Peep e a simplicidade das redes e violões de Riposatevi; entre a força crítica e intelectual do mestre e a capacidade expressiva do cineasta.

O arquiteto e a cidade: solo comum da vida social

Arquitetos não são importantes. Seu trabalho não é importante. Importantes são as consequências de suas ações.

Vogadors Architectural Rowers.
 [Vídeo apresentado na representação da Catalunha e Ilhas Baleares]

Common Ground é, em diversos casos, tomado literalmente, como solo, terreno, território em que a vida ocorre. É nesse sentido que a Dinamarca defende o território da Groenlândia contra os ataques do capital internacional, discutindo alternativas sustentáveis que assegurem o usufruto de suas riqueza naturais a seus cidadãos, dentre as quais um aeroporto que é também porto, articulando em um nó intermodal seus dois principais meios de transporte (Fig.5). É também nesse sentido que aparece a preocupação com a cidade, sua forma e suas articulações como fato que orienta as decisões do arquiteto ao projetar um edifício. Essa importância do reconhecimento do fato urbano como pré-requisito para a prática da arquitetura é o pano de fundo da representação oficial da Suiça, e é um princípio que orienta a prática de arquitetos como o alemão Hans Kollhoff, Vittorio Magnago Lampugnani, autor do plano diretor da Novartis, na Suiça, e especialmente do premiado com o Leão de Ouro pelo conjunto da obra, o português Alvaro Siza Vieira. É um fundamento central da obra do espanhol Rafael Moneo, que apresenta um conjunto de desenhos originais de seus projetos, realizados em Madrid. Moneo argumenta que ?? nada é mais favorável e desejável que a prática da arquitetura em sua própria cidade, onde o ‘solo comum’ é nada além do conhecido quadro de nossas vidas cotidianas.?/p>

A ideia da constituição de uma base comum, relativamente anônima e compartilhada pelos cidadãos, decorrente da prática de arquitetos também anônimos ?pelo menos para o métier ?é a base da exposição apresentada por OMA- Office for Metropolitan Architecture. Denominada ?em>Public Works. Architecture by Civil Servants?– Obras Públicas. Arquitetura por servidores públicos -, apresenta um conjunto de obras públicas realizadas em diversas cidades europeias por arquitetos que serviam aos quadros públicos dos setores de planejamento físico de suas cidades. Um dos aspectos interessantes da exposição, que se opõe à lógica do star system e dialoga com o argumento de Moneo, é o fato de que essas obras se tornaram referência para seus cidadãos, em parte por terem sido produzidas por profissionais que conheciam profundamente as especificidades de cada lugar.

No contexto da discussão da importância da ação e da presença do arquiteto na cidade, destaca-se a apresentação da obra de Luigi Snozzi, no Arsenale (Fig. 6). A obra de Snozzi é um capítulo à parte na arquitetura contemporânea, dada a singularidade da longa presença de um arquiteto com a sua sensibilidade em uma cidade de menos de 1.000 habitantes. O vídeo de Alberto Momo aponta, através de depoimentos de moradores de Monte Carasso e de arquitetos como Vittorio Gregotti, a importância do trabalho de Snozzi para a criação de espaços e equipamentos públicos que impedissem uma possível periferização do local e que recuperasse seu patrimônio, convertendo o velho convento, então um cortiço, em local privilegiado para a vida social. Gregotti associa a atuação de Snozzi à de um médico da família, que está sempre próximo e a quem todos recorrem. Essa proximidade transparece no tocante depoimento de uma criança, narrando a visita do arquiteto à escola, para explicar aos estudantes a importância da arquitetura como transformação da natureza para que a vida humana tenha lugar. O depoimento do arquiteto enfatiza a importância da relação entre o arquiteto e o prefeito da cidade, rara conjugação entre arquitetura e política, neste caso a favor daquela pequena comunidade.

Práticas informais e cotidianas: da subversão à norma

Táticas urbanas, autogestão, agentes, agitadores, ativadores, valorização do comum, subjetivação coletiva, projeto colaborativo, culturas do compartilhamento, co-produção da sociabilidade, ações locais e trans-locais, participação real, economias diversas, mobilidade e multiplicidade, micro-políticas, remontagem e desmontagem, resiliência rururbana, transmissão rizomática, ocupação temporária e reversível, interstícios urbanos, foco no usuário. Cada um desses temas é tratado na participação do Atelier D’Architecture Autogérée através de pequenos panfletos, aos modos de manifesto, e também em exemplos concretos de intervenção urbana e articulação social.

Curiosamente, Estados Unidos e Inglaterra, dois países dominantes e usualmente conservadores em relação às práticas arquitetônicas, são justamente os primeiros a institucionalizar as práticas cotidianas como valor dominante, o que permite especular sobre o potencial dessas práticas – outrora à margem – em sistemas e contextos altamente regulamentados.

Intitulada ‘Spontaneous Interventions: design actions for the common good‘ ?Intervenções Espontâneas: ações de projeto pelo bem comum -, a mostra oficial norte-americana apresenta 124 ações, em geral propostas de modo autônomo pelos próprios arquitetos, designers e artistas, que abordam situações urbanas, arquitetônicas, de infraestrutura e de comunicação. “Provisório, improvisado, guerrilha, não solicitado, tático, temporário, informal, não planejado, participativo, de código aberto?são termos recorrentes nos discursos e na prática dos diversos profissionais apresentados. Destaca-se o fato de que a seleção da exposição oficial se fez através de um concurso público, o que estimula a discussão e a reflexão sobre a questão da arquitetura e da cidade muito antes do próprio evento, e abre espaço para novas proposições curatoriais. O que é, também, o caso da representação oficial da Inglaterra, que escolheu por concurso público dez equipes de arquitetos, comissionando a cada um deles uma viagem a um país diferente. Como nos velhos tempos das navegações, tratava-se de buscar alhures práticas alternativas que permitam redefinir as possibilidades de atuação dos arquitetos. Brasil, Rússia, China, Holanda, Alemanha, Tailândia, Argentina, Nigéria, Estados Unidos e Japão foram destinos eleitos para colocar em perspectiva novas práticas, a partir da visão de dez “exploradores? como definiram os curadores da mostra, Vanessa Norwood e Vicky Richardson. No Brasil, a dupla Aberrant Architecture visitou os CIEP’s ?Centros Integrados de Educação Pública ?concebidos por Darcy Ribeiro e projetados por Oscar Niemeyer, apresentando-os como um exemplo possível da promoção da educação em larga escala. Na Argentina, Elias Redstone desvendou os meandros do ?em>Fideicomiso?Fig. 7), um dispositivo legal que favorece a participação de arquitetos no mercado da construção civil atuando como pequenos incorporadores, o que historicamente vem ampliando a qualidade da produção imobiliária média no país. Pesquisou o modus operandi dos arquitetos que empreendem pequenos edifícios através formação de grupos de investidores que geralmente são futuros moradores. Nesse contexto, o arquiteto assume uma posição privilegiada que lhe permite tomar decisões desde a escolha do terreno até a definição da tipologia das unidades residenciais, superando a barreira imposta pelos grandes incorporadores.

Contra a obsolescência: crise, catástrofe e esperança

A crise econômica mundial é, sem dúvida, uma motivação para grande parte das discussões que tratam da obsolescência e da reutilização de edifícios. Na representação oficial da Grécia, um bem montado pavilhão dá conta de, mesmo em tempos de crise, colocar em discussão dignamente a questão. A Espanha, presente em diversas situações, optou, na sua representação oficial, por mostrar alguns escritórios e ressaltar a experiência acumulada de seus arquitetos. No Arsenale, contudo, Luis Fernando Galeano abre espaço para a discussão sobre a crise no país, denunciando que mais da metade dos escritórios de arquitetura espanhóis fechou as portas no último ano, e trazendo jovens arquitetos para discutir pessoalmente a questão com os visitantes.

O Japão apresentou em seu pavilhão a proposta do arquiteto Toyo Ito (Fig. 8), desenvolvida imediatamente após o tsunami que devastou parte do país, para um sistema de construção simples que permitisse a implantação rápida e descomplicada de moradias para os desabrigados. As inúmeras maquetes da casa de troncos de madeira roliça contra as paisagens devastadas pelo Tsunami revelam um dos mais fortes conteúdos humanos da Bienal, não coincidentemente premiado como o melhor pavilhão.

Discutir a obsolescência das infraestruturas, seu custo de manutenção e seu potencial de apropriação é o que faz a Letônia, em um sensível registro da quase ruína do Linnahall, um gigantesco centro de esportes e arte construído para receber atividades esportivas dos Jogos Olímpicos de 1980 da então URSS. Imagens do edifício concorrem com um conjunto de depoimentos, em que participam desde autoridades a uma adolescente que viu ali o show mais aguardado de seus ídolos. Menos de 30 anos após a sua construção, o Linnahall, então premiado como obra relevante de arquitetura, denuncia a ineficiência do estado e cobra uma ação que lhe recrie a utilidade como uma potente plataforma para a vida contemporânea na Letônia.

Entre todas as discussões sobre o aproveitamento de estruturas ociosas, destaca-se o registro da ocupação da Torre David, na Venezuela, cuja instalação – Torre David – Gran Horizonte – foi premiada com o Leão de Ouro do juri da exposição. Enquanto o Pavilhão Venezuelano ?projetado por Carlo Scarpa e felizmente reaberto nesta edição ?apresenta uma exposição de caráter quase publicitário sobre a construção habitacional oficial, com pouquíssima qualidade de arquitetura e forte apelo ideológico, a participação do grupo integrado por Urban-Think Tank, o curador e escritor britânico Justin McGuirk e o fotógrafo Iwan Baan no Arsenale aponta para uma saída muito mais potente para a questão da habitação. A ocupação da Torre David ?uma estrutura abandonada de um edifício corporativo em Caracas ?reacende a questão do direito à cidade, mais do que do direito à moradia, e revela a importância da relação com o espaço urbano, que se constrói em uma via de mão dupla: os habitantes estão na cidade, usufruindo de suas infraestruturas; e a cidade ?e sua lógica de indeterminação e sobreposição de usos, que gera vitalidade ?transparece na diversidade da sua ocupação não planejada, em que a estrutura inacabada se apresenta como uma potente plataforma aberta.

Nesse mesmo sentido, “Reduzir, Reusar, Reciclar. Arquitetura como Recurso?faz da participação alemã nesta bienal um ponto alto, devido à sua sensibilidade e consistência. É interessante observar que o mais rico dos países europeus ?e até o momento o menos afetado pela crise econômica ?seja o primeiro a colocar a questão da reinvenção criativa e sustentável das suas infraestruturas e de seu tecido urbano. Trata-se de um consistente ?e historicamente construído – reconhecimento da relevância das suas estruturas e de suas condições demográficas, em que o crescimento não é mais o que orienta as decisões políticas. A partir da constatação de que 80% dos orçamento destinado à construção habitacional na Alemanha vem sendo usado na reciclagem do estoque imobiliário existente, a proposta curatorial toma emprestada a tríade dos movimentos ambientalistas para propor possíveis estratégias para abordar a arquitetura existente e, por consequência, o tecido urbano por ela definido. A consistência da mostra se verifica nas palavras de seu curador:

Se nós realmente desejamos abordar a questão das emissões de carbono, entretanto, temos de considerar todo o ciclo de vida dos edifícios. Isso significa, quando comparada a eficiência energética de edifícios existentes à de novas construções que os substituam, a energia da construção original deve ser também levada em conta, assim como a energia envolvida na demolição e remoção, na produção e construção do novo edifício, e na operação do edifício (aquecimento, refrigeração, iluminação), bem como a mobilidade gerada por ele.
Quando todos esses fatores são levados em consideração, é evidente que a abordagem mais sensível é estender a vida útil dos edifícios existentes através de mínimas intervenções.
(?
Entretanto, o consumo de energia é apenas um dos aspectos que devem ser considerados. Porque edifícios e infraestruturas existentes devem ser vistos como um importante recurso cultural, social e arquitetônico para dar forma ao nosso futuro, uma atitude fundamentalmente positiva deve ser adotada frente ao estoque de edificações existente.[4]

Em outro momento, o curador argumenta que a lógica do sistema 3R implicaria em inverter a própria lógica da arquitetura: ?em>A menor intervenção de repente passaria a ser a melhor ?e nenhuma mudança seria ainda melhor?

Em uma bem montada exposição independente, Catalunha e Ilhas Baleares trazem a melhor contribuição para a discussão do tema, que parte da apresentação, através de mais de 100 obras, do resultado positivo do boom da construção que permitiu a uma geração de arquitetos espanhóis realizar uma produção de qualidade; reconhece a crise e seus efeitos; elege nove obras de escritórios e arquitetos cujos procedimentos partem das adversidades para orientar suas escolhas de projeto, com resultados esteticamente potentes e austeros; e termina apresentando um conjunto de obras históricas de grandes arquitetos espanhóis que, de algum modo, constituem exemplos dessa estética da escassez.

Em meio à mostra, o vídeo Vogadors apresenta nove questões, colocadas pelos arquitetos participantes da mostra. Dentre elas, um argumento notável, capaz de balançar as mais estáveis posições do campo profissional: ?em>Não deveriam os arquitetos ser mais necessários em tempos de necessidade do que de abundância??/p>

Essa questão, que definitivamente aponta novos caminhos, nos induz a uma reflexão a fim de conduzir a prática arquitetônica em um sentido diverso do que historicamente caracterizou a profissão que, segundo Garry Stevens, seria a arte de fazer coisas de bom gosto para pessoas de bom gosto, apenas.

notas

[1]Comunicação feita em Noroit (Arras) em novembro de 1974 e publicada em Noroit, 192, novembro de 1974, dezembro de 1974, janeiro de 1975.

[2]CHIPPERFIELD, David. Biennale Architettura 2012. Common Ground. Venezia: Fondazione La Biennale Venezia, 212, p. 14. [Catálogo].

[3]Cf. DURAND, José Carlos. Le Corbusier no Brasil. Negociação Política e Renovação Arquitetônica. //www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_16/rbcs16_01.htm

[4] If we really want to address the issue of carbon emissions, however, we have to consider the overall lifecycle of buildings. That means, when comparing the energy efficiency of existing buildings as opposed to replacements, the original construction energy should also be taken into account, as should the energy involved in demolition and disposal, in the production and construction of the new building, and in the operation of the building (heating, cooling, lighting) as well as the mobility generated by it.
When all these factors are taken in consideration, it is clear that the most sensible approach is to extend the lifespan of existing buildings by way of minimum intervention.
(?
However, energy consumption is only one aspect that has to be taken into consideration. Because existing buildings and infrastructure should be seen as an important cultural, social, and architectural resource for shaping our future, a fundamentally positive attitude has to be adopted toward the existing stock.
PETZET, Muck. Reduce/Reuse/Recicle. Architecture as Resource. Curatorial statement. 13th International Architecture Exhibition La Biennale di Venezia, 2012.

Carlos Alberto Maciel
Arquiteto e Urbanista (1997), Mestre (2000) e Doutorando (2011-) pela Escola de Arquitetura da UFMG, onde é professor de projeto. É coordenador geral de projetos no Departamento de Planejamento Físico e Projetos da UFMG, sócio do escritório Arquitetos Associados, fundador e editor de MDC. carlosalberto@arquitetosassociados.arq.br


Colaboração editorial: Danilo Matoso

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O valor das obras de um homem não está nas obras, mas em seu desenvolvimento pelas mãos de outros, em outras circunstâncias.  Paul Valéry

Percebi que a arquitetura estava ligada a uma problemática nacional e popular e que era preciso arranjar uma ética que me reconciliasse com os ideais do povo brasileiro.
Vilanova Artigas

A arquitetura brasileira apresenta historicamente duas posições distintas quanto à importância e uso da técnica: a primeira, dominante desde o surgimento da arquitetura moderna no país, preocupa-se com a exploração plástica da estrutura e estabelece um discurso sobre a aplicação primorosa do conhecimento da construção. Esta vertente é bem representada por obras exemplares de arquitetos como Oscar Niemeyer, Vilanova Artigas e Paulo Mendes da Rocha, e ainda pela obra inicial de João Filgueiras Lima e algumas realizações de Affonso Reidy e Lina Bo Bardi. Não obstante a grande diferença quanto à escala, programa, origem dos recursos e mesmo a época da realização das suas obras, os arquitetos citados reeditam, cada um à sua maneira, um “discurso sobre a técnica? Oscar Niemeyer é quem mais radicalmente explorou as grandes estruturas, nas suas obras brasileiras possibilitadas por sua opção em trabalhar exclusivamente com obras públicas, e nas obras estrangeiras, para “mostrar o desenvolvimento da enge­nharia nacional? discurso que se conserva até a produção recente do arquiteto. Vilanova Artigas, em outro sentido, explorou as grandes estruturas em especial através do argumento de Auguste Perret de que “?preciso fazer cantar os pontos de apoio? Foi ainda um dos arquitetos que mais influenciou a arquitetura paulista no que concerne à aplicação do concreto armado aparente com a exploração dos grandes planos e empenas estruturais (Garagem de Barcos Santa Paula ?1961, FAU-USP ?1961) das lajes nervuradas permitindo o grande vão (FAU-USP, Rodoviária de Jaú ?1973, Vestiários do São Paulo Futebol Clube ?1961, Anhembi Tênis Clube ?1961, Ginásio de Utinga ?1962, Colégio 12 de Outubro – 1962) e da racionalidade construtiva dos “quatro pontos de apoio?(Casa Taques Bitencourt ?1959, Casa Ivo Viterito ?1962, Casa Mendes André ?1966), que se tornou aspecto recorrente na arquitetura paulista pós-Artigas, inclusive na obra de Paulo Mendes da Rocha. Nesta última, a matriz racionalista, herdada de Artigas, que caracterizou seus primeiros trabalhos como respostas generosas e inventivas às necessidades do cotidiano, cede lugar a um maior refinamento da técnica e da forma que dela decorre, o que aparece em projetos como o Museu Brasileiro da Escultura ?1988 e a marquise da Praça do Patriarca ?1992.

Para além da necessidade programática, estes projetos editam elementos de alta tecnologia que procuram estabelecer um discurso sobre a fundação ou edição do lugar através de uma exibição do conhecimento. Numa outra direção, o refinamento construtivo conduziu à exploração da lógica de montagem e industrialização de grandes estruturas na obra de Lelé, destacando-se os projetos iniciais em Brasília ?década de 70 e o Centro Administrativo da Bahia ?1973, que apresentam uma industrialização com grandes peças e com uma complexa lógica de montagem. Já a obra de Lina Bo Bardi explorou as estruturas protendidas, gerando à época o ?em>maior vão livre do mundo? no Museu de Arte de São Paulo – 1957, liberando o belvedere de inegáveis qualidades quanto ao uso público e abertura para a paisagem. Antecedeu a solução atirantada das lajes do MASP a bela solução construtiva de Affonso Reidy no projeto do Museu de Arte Moderna ?1953, no Rio de Janeiro, que reduz a seção dos pilares pela utilização da compensação entre momentos fletores na base do “V? O atirantamento das lajes, liberando um dos pavimentos ?à exceção do MAM, em geral é o térreo o pavimento liberado – foi também trabalhado por Oscar Niemeyer na Sede Mondadori – 1968, em Milão, e por Vilanova Artigas no Laboratório Nacional de Referência Animal, Lanara – 1975, em Pedro Leopoldo, MG. Esta solução, por ampliar os percursos das cargas até a fundação, contrariando a lógica natural imposta pela gravidade, é significativamente mais onerosa do que uma condução mais direta dos esforços, e nem sempre justificada quando confrontada com os usos em questão. Explicam-se este e outros artifícios estruturais não pela simples resposta ao programa colocado, mas pelo esforço de demonstração de um avanço da engenharia brasileira.  Para isso, estes arquitetos realizam edifícios cuja virtuosidade técnica, em geral de alto custo e construção especializada, confere às obras o status de ícone, monumentos que passam a ser cultuados e assimilados pelo inconsciente coletivo como símbolos do progresso do país e da alta capacidade de que dispomos para a construção dos principais edifícios públicos que abrigam e representam as instituições nacionais. Pelo alto grau de exploração t­écnica, nem sempre disponível de forma generalizada, e por apresentarem alto custo decorrente, entre outras coisas, da alta especia­lização construtiva, têm menor capacidade de gerar desdobramentos para o aprimoramento da construção cotidiana em larga escala. Sobre esta tendência, Lucio Costa se manifestou sabiamente:

A idéia é sempre exigir das novas técnicas soluções extremadas, não é? (…) Nas mãos de um arquiteto qualificado, naturalmente ele faria bem, mas essas levas e levas de arquitetos, cada um pretendendo “eu acho bonito? estão destruindo completamente o que era honesto: uma arquitetura vinculada a um sistema construtivo, uma coisa assim, sempre com a participação da qualidade, da intenção de harmonia (…). Porque nesta intenção o arquiteto se revela. (…) Porque realmente os arquitetos são estimulados para serem gênios, para inventar. Então o sujeito fica inventando demais, o próprio Oscar foi culpado disso [1].

De outro lado, é possível enumerar projetos em que se coloca em primeiro plano como fato mais relevante do uso e desenvolvimento da técnica não a sua própria demonstração, mas a preocupação em editar o conhecimento da construção de modo a responder aos problemas específicos colocados em cada situação. Esta outra maneira de consi­derar a importância da técnica esteve presente na obra de Lucio Costa e em grande parte da produção de Lina Bo Bardi. Nelas, a conciliação entre os padrões eruditos da arquitetura moderna e a tradição, tanto da arquitetura luso-brasileira, por um lado, como da arquitetura popular e o vernáculo, de outro, fundam uma abordagem da técnica de modo menos discursivo e mais fundado na interpretação de uma tradição construtiva [2]. Todas as casas projetadas por Lucio Costa são exemplares neste sentido. Esta abordagem também é fundadora da obra de Joaquim Guedes, que vale ser ressaltada em dois aspectos: primeiro, por ela mesma constituir uma crítica à atitude dominante da exploração formal das estruturas, revelando um decoro que apresenta uma “clara contenção no uso do concreto aparente?em favor de uma maior diversidade de materiais e tecnologias permitindo responder melhor ao clima, à economia ?escassez de recursos, e às “necessidades do dia-a-dia de atividades humanas específicas?[3]. Em segundo lugar, configura também uma atitude de resistência que retoma o vernáculo e as tradições cons­trutivas locais, reinterpretando-as para melhor respon­der aos problemas e limitações brasileiras. Essa postura crítica aparece no projeto do Grupo Escolar Ataliba Nogueira, de 1961, é exemplar nos projetos para a Cidade de Caraíba, na Bahia, e ainda orienta diversos projetos de residências.

Por último, vem se mostrando exemplar a obra recente de João Filgueiras Lima, que, para além da busca da invenção do maior vão ou de demonstração de virtuosidade, pesquisa sistemas cuja complexidade, lógica de montagem e adequação ao clima transportam nosso mais alto conhecimento para a construção de edifícios para o cotidiano, viabilizando edifícios de qualidade assustadoramente acima da média nacional que ao mesmo tempo apresentam baixo custo e grande facilidade de assimilação dos princípios de montagem nos mais variados locais do país, por mão-de-obra nem sempre especializada. Seu senso de economia, modularidade e repetição, facilidade e agilidade de montagem constituem uma resposta contundente à realidade brasileira, com grande potencial didático de gerar desdobramentos virtuosos para melhorar a qualidade da grande massa de construções anônimas que conformam nossas cidades [4]. Este compromisso com o desenvolvimento de uma técnica que nos permita superar o atual estágio civilizatório, com uma preocupação mais centrada na resolução de problemas aparentemente simples quando comparados ao avançado domínio da tecnologia que nossos grandes edifícios já demons­traram, mas complexos e aparentemente intrans­poníveis se abordados na construção cotidiana, parece apontar uma alternativa de construção viável e democrática para a ação dos arquitetos brasileiros contemporâneos, uma vez que recupera a racionalidade e a exploração das virtudes da técnica próprias da Modernidade, mas evita a ingênua crença no seu predomínio como um a priori positivo e universal. Concilia as virtudes da modernidade com as limitações e os valores locais, absorvendo criticamente um dos maiores avanços que o pensamento pós-moderno apresentou: a constatação do fim dos meta-relatos legitimadores e a valorização das especificidades regionais.

Se quisermos dar respostas mais abrangentes e pertinentes à sociedade, será preciso editar o conhecimento da construção para responder objetivamente às limitações já amplamente conhecidas ?em especial a escassez de recursos e a baixa qualificação da nossa mão de obra.

Sabemos produzir monumentos; falta-nos a competência para responder ao cotidiano. Transpor todo o conhecimento desenvolvido nos últimos 60 anos para um domínio de aplicação mais amplo e mais acessível a todos, buscando uma construção mais pertinente que reduza a distância entre o edifício comum e o de exceção. Por de lado o discurso e colocar a mão na massa. n

notas

1.  Cf. “Entrevista? Revista Pampulha, n.1, novembro-dezembro de 1979, p.12-19.
2.  Sobre a diferença entre as estratégias de ambos, ver WISNIK, Guilherme. Lucio Costa. São Paulo: Cosac & Naify, 2001, p.35.
3. CF. CAMARGO, Mônica Junqueira de. Joaquim Guedes. São Paulo: Cosac & Naify, 2000.
 4.  Em recente artigo na Revista AU, Edison Eloy, Yopanan Rebello e Marta Bogéa apontam a pertinência das soluções  construtivas desenvolvidas por Lelé, Joan Villá e Eladio Dieste para as condições sociais, econômicas e culturais sul-americanas. In: “Invenção: popular e erudito? Revista AU, n. 141, dezembro 2005, p. 72-75.

carlos alberto maciel (1974)
Arquiteto e Urbanista (EA-UFMG – 1997) e Mestre em Teoria e Prática de Projeto (EA-UFMG – 2000),  professor no Unicentro Izabela Hendrix, autor de diversos projetos e obras destacados em premiações como o 3o, 4o , 6o e 7o Prêmios Jovens Arquitetos (1997-1999-2004-2005), a 4a Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo (1999), o 4o Prêmio Usiminas Arquitetura em Aço ?Centro de Arte Corpo (2001), a Premiação do Instituto de Arquitetos do Brasil ?São Paulo (2004), entre outros. Possui escritório próprio desde 1996.

contato: carlosalberto@arquitetosassociados.arq.br | www.arquitetosassociados.arq.br

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Éolo Maia | Maria Josefina Vasconcellos

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DESDOBRAMENTOS RECENTES DA ARQUITETURA MODERNA: ESTAMOS CONDENADOS À MODERNIDADE?


Ano I . N.2 . fev.2006 . ISSN – 1809-4643

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Editorial

Verificado o esgotamento da arquitetura pós-moderna, devido à abordagem excessivamente ornamental de grande parte de sua produção, desvinculada do compromisso com a qualificação do ambiente construído para a vida cotidiana, a arquitetura tem voltado as atenções para os procedimentos e conceitos oriundos da Modernidade.
Já em 1985, Kenneth Frampton apresentou o conceito de Regionalismo Crítico como uma postura de conciliação entre a universalização proposta pela modernidade e as especificidades locais, visto já naquela época como uma alternativa aos desdobramentos do pós-modernismo.
No Brasil, nos anos 90, observa-se uma grande onda de publicações que registram as obras dos nossos arquitetos modernos. No panorama internacional, desde o Desconstrutivismo, o reconhecimento e a interpretação crítica de conceitos da modernidade tem sido o fundamento da ação dos arquitetos. Como apontaram Montaner e Savi, nas obras ditas minimalistas a abstração formal, a autoreferência anti-historicista, a repetição de elementos, a simplificação geométrica, a forma estrutural, a exploração da materialidade e a regularidade reeditam procedimentos
compositivos decorrentes da arquitetura moderna em edificações de forte impacto visual, nem sempre contextualizadas aos lugares em que se implantam. Essa reedição de conceitos da arquitetura moderna vem culminar em uma reedição nostálgica do repertório formal dos anos 30 a 60, que, simplificado, esvaziado de seu conteúdo ético e apoderado pelo mercado imobiliário, vem produzindo no Brasil as inexpressivas “casas brancas de vidros verdes”, em uma progressiva banalização que é mais uma reedição pós-moderna do repertório abstrato do que propriamente uma posição crítica quanto às possibilidades de edição da técnica contemporânea na construção de espaços mais qualificados e como maior ênfase no âmbito público, como fizeram nossos melhores arquitetos.
 Posto que as possibilidades técnicas e materiais hoje disponíveis no campo de ação dos arquitetos não diferem significativamente daquelas decorrentes da revolução industrial, que geraram a Arquitetura Moderna, pergunta-se: é possível produzir sobre outras bases que não aquelas que fundaram a modernidade? Em que o paradigma ambiental, a sensibilidade com o lugar e a relativização do valor do progresso vêm modificar os desígnios da produção do espaço habitável na contemporaneidade? Como país jovem, cuja cultura foi moldada fundamentalmente pela modernidade, estamos condenados ao futuro? Ou há continuidades desejáveis que nos permitam contribuir para o estabelecimento de outro patamar de desenvolvimento para o país e outro estágio de civilização para o nosso povo?

Carlos Alberto Maciel

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Álvaro Puntoni

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Existe continuidade, porque negar o legado de pessoas inteligentes seria uma estupidez. [2]

Desta forma o arquiteto português Eduardo Souto Moura reagiu ao ser indagado sobre seu percurso na Escola do Porto, seu trabalho e suas relações com Fernando Távora e Alvaro Siza. Continuidade [3] e, outro termo também utilizado por ele, compatibilidade, são palavras interessantes e poderiam auxiliar a moderar esta discussão a ser promovida pelo MDC acerca da persistência da Arquitetura Moderna.

Não abdicar de uma inteligência construída talvez seja o ponto de partida para o estabelecimento de um possível e desejável denominador comum na Arquitetura Contemporânea Brasileira.

Não se trata de simplesmente aceitar passivamente ou renegar as experiências anteriores, como quem escolhe fortuitamente um caminho, mas saber valorizar o que de essencial e significativo elas realizaram e as suas possibilidades de desdobramento e multiplicação no presente momento, como quem procura conhecer todas as veredas de um caminho.

Nesse sentido, seria interessante sublinhar a idéia de Escola para contribuir com a pauta do MDC. Existe uma Escola Brasileira?

Considerando a diversidade da produção da Arquitetura Brasileira Contemporânea, as diferenças regionais, todos os outros “paises dentro do país? as inúmeras faculdades de arquitetura, talvez seja uma tarefa árdua definir esta Escola. Talvez sejam várias Escolas.

A Arquitetura Moderna Brasileira, fundada na década de quarenta a partir do empenho de uma geração única e notável de arquitetos como Lucio Costa, Affonso Eduardo Reidy, Oscar Niemeyer, MMM Roberto, Sergio Bernardes, Jorge Moreira, entre outros no Rio de Janeiro, foi fomentada principalmente pela ação governamental. Correspondia esta ação a um anseio do Estado Novo de se mostrar com uma imagem moderna e os arquitetos convocados, juntamente com os artistas de outras áreas, souberam aproveitar este momento histórico.

Quase que simultaneamente, a Arquitetura Moderna se estabelece em São Paulo, sob uma matriz diversa e mais relacionada à iniciativa particular e a fundação das escolas [4] com arquitetos fundamentais como Rino Levi, Abelardo de Sousa, Helio Duarte, Eduardo Corona, Oswaldo Bratke, Vilanova Artigas , entre outros. Trata-se de um momento impressionante e vigoroso da Arquitetura Moderna  em São Paulo. Artigas (Politécnica, 1935) representa uma referência por sua postura ideológica e os desdobramentos de suas ações incisivas no ensino, além obviamente da qualidade de suas obras.

Da primeira, a Escola Carioca, pouco restou, além de um patrimônio de obras representativas e significativas, mas únicas. Apesar da influência que exerceram no país, não encontraram aparentemente ressonância e aprofundamento em um processo de formação e ensino no Rio de Janeiro da mesma forma que ocorreu em São Paulo, a Escola Paulista, duas vezes “escola? portanto.

O vínculo das faculdades de São Paulo com a Engenharia Civil ?ambos os cursos advêm do curso Politécnico ?marcam uma das principais características da Arquitetura Paulista que é a valorização e, muitas vezes, a sublimação da razão construtiva. Uma arquitetura que se explica silenciosamente por meio da lógica de seus espaços e soluções estruturais e, mais uma vez, assume o papel de escola.

Em São Paulo segue uma segunda geração tão importante quanto a pioneira: Carlos Milan, Joaquim Guedes, Fábio Penteado, Pedro Paulo Saraiva, Eduardo de Almeida, Abraão Sanovicz, Ícaro de Castro, Marcos Acayaba, entre outros, com destaque para Paulo Mendes da Rocha. Formado no Mackenzie (1954), Mendes da Rocha ganha o concurso para o Ginásio do Paulistano em 1957 e é convidado por Artigas, que havia projetado a Casa Baeta no mesmo período, para ser professor assistente na FAUUSP. Mesmo considerando a disparidade entre o projeto de uma casa e de um clube, havia na estrutura e espaços do Ginásio soluções impressionantes e essencialmente novas. Deste encontro não antagônico, mas complementar entre dois arquitetos de duas gerações distintas, advém uma arquitetura luminosa que orienta como um farol parte da atual geração de arquitetos.

Não se pode deixar de mencionar ainda as contribuições singulares dos arquitetos que escolhem a cidade para se instalarem como Warchavchik, Rino Levi e, principalmente, Lina Bo. Aparentemente contestada pelos arquitetos paulistanos, a “arquiteto italiana?vai contribuir de uma forma indelével com sua visão profundamente humanista e generosa, sem deixar de considerar a força da sua obra, que acena para a possibilidade de caminhos menos rígidos e ortodoxos na Arquitetura Paulista.

Desta profícua convivência pode-se afirmar que se formaram outros arquitetos e outras arquiteturas.

Deve-se ressaltar que apenas 15 anos após a fundação das faculdades de arquitetura em São Paulo, quando discutiam e aplicavam seus novos e promissores programas de ensino, concatenados com as demandas daquele momento histórico, instalou-se no País a Ditadura Militar (1964) e iniciou-se um processo de destruição cultural sem precedentes. Brasília havia sido inaugurada há apenas três anos…Durante vinte anos “os arquitetos velaram? [5] Cassados, censurados, cindidos politicamente, profundamente enfraquecidos era difícil afirmar as posições. Talvez fosse mais conveniente assimilar os influxos externos.

Foi neste quadro que vicejou o Pós-Moderno em nossa arquitetura. Correspondia a um compreensível anseio de uma necessária renovação de uma experiência que aparentemente havia conduzido o país a um impasse, ao fim do caminho. A Arquitetura Moderna não havia feito a tão desejada mudança social e por isso, estaria condenada a falência. Aparentemente estava claro, apesar de sempre se afirmar o contrário, que arquitetura era uma disciplina fundamental, mas que apenas desenharia a solução social, esta sim política e antecedente. Como dizia Artigas, era possível ser artista e político ao mesmo tempo.

É inegável, da mesma forma que ocorreu com o Estado Novo, a Ditadura e seu projeto desenvolvimentista e modernizador serviu-se da Arquitetura Moderna e pode sugerir um vínculo entre ambos. Exatamente como havia ocorrido com a assimilação e a burocratização dos princípios da Arquitetura Moderna pelas corporações capitalistas após a sua fundação no início do século XX, relacionada aos movimentos sociais e políticos europeus. Era necessário rever esta hegemonia.

O fato é que a experiência do pós-moderno em nossa arquitetura não encontra o mesmo vigor da anterior, não se constituiu em escola.

Em São Paulo, notadamente, as novas gerações de arquitetos formadas em parte pelos professores, seus alunos, os alunos dos alunos, não abdicaram da inteligência construída.

Todas as áreas da cultura ressentem obviamente da ausência de um projeto para o país, e não poderia ser diferente com a arquitetura. Mas hoje se pode acenar novamente no cenário da arquitetura internacional, seja nas publicações ou exposições, com frases mais elaboradas, com construções mais precisas.

Neste momento de reconstrução do país, vinculado ao processo de democratização consolidado nos últimos anos, nota-se o revigoramento da Arquitetura Brasileira como expressão do fortalecimento da cultura brasileira.

A importância de reorganizar o Ensino nesse momento é fundamental. As faculdades aparen­temente não ensinam como fazer, tampouco a pensar, o que nos conduziria a uma pergunta subseqüente: o que fazer.

No entanto existe uma questão anterior: o fato da profissão não estar organizada pressupõe que a escola não necessite estar organizada.

Urge a discussão acerca das formas possíveis de organização e a conseqüente valorização da profissão, seu real aprofundamento com a questão da produção e as reais demandas da sociedade.

As escolas, neste quadro, são necessariamente, novamente ou inauguralmente, os espaços de formulação das questões e da construção do saber, fortemente vinculadas aos seus lugares. As escolas das Escolas.

Considerações aritméticas a parte, um pouco poéticas talvez, o “mínimo?do MDC poderia também ser “máximo? como fosse possível multiplicar e deixar-se ser dividido, para ampliar o inumerável, em busca de uma razão, uma inteligência única, quando pode e deve ser múltipla e variada.n

notas

1. Este texto foi originalmente elaborado para apresentação da mostra itinerante Panorama da Arqutectura Brasileña organizada pela Escola da Cidade e promovida pela Universidade Los Andes de Bogotá, Colômbia.
2. Trigueiros, Luis. Eduardo Soto de moura. Lisboa, Editora Blau Lda., 1994. p.27
3. Interessante notar que a exposição sobre arquitetura portuguesa em São Paulo em 2005 chamava Descontinuidade.
4. A Faculdade de Arquitetura Mackenzie é fundada em 1947 e a FAUUSP – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo em 1948.
 5. “Do sofrimento do nosso povo, posso dizer que participei  profundamente. Alguém terá olhos para, um dia, ler nas formas que projetei, todo este sofrimento. Se verá uma poética traduzida. Enfim, os arquitetos não dormiram, eles velaram?Depoimento de Vilanova Artigas in Vilanova Artigas, Instituto Lina Bo Bardi, 1997.

álvaro puntoni
Formou-se na Faculdade de Arquitetura da Universidade de São Paulo (FAUUSP) em 1987. Mestrado (1999) e doutorado (2005) pela Faculdade de Arquitetura da Universidade de São Paulo (FAUUSP). Professor desde 1990. Atualmente leciona na FAUUSP, Escola da Cidade e Universidade Anhembi Morumbi.
 Atualmente é membro do Grupo SP, escritório de arquitetura em São Paulo. Participou de quarenta concursos nacionais e internacionais, dentre os quais se destacam: primeiro prêmio Concurso Nacional para o Pavilhão do Brasil na Expo?2 em Sevilha (1991), primeiro prêmio Concurso Nacional de Idéias do Memorial à República em Piracicaba (2002), segundo prêmio Concurso Nacional par a Sede da Petrobras em Vitória (2005).

contato: alvaro@puntoni.arq.br |  www.puntoni.arq.br

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Carlos Alberto Maciel

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O que têm em comum Lucio Costa, Renzo Piano, Oscar Niemeyer, Rem Koolhaas, Ângelo Bucci, Foreign Office Architect’s, Paulo Mendes da Rocha, Mecanoo, Carlos Ferrater, Eduardo de Almeida, MVRDV, Gustavo Penna e Peter Eisenman?

Todos eles, em tempos diversos e com modos diferenciados de abordar a questão, adotaram a interpretação ou reinvenção da topografia como fato  gerador do projeto. Isso seria uma banalidade não fosse, por um lado, a maciça e radical recorrência desta estratégia na produção contemporânea internacional [1], e, por outro lado, a surpreendente distância temporal em que esta mesma estratégia aparece na produção brasileira. Essas intervenções ora reeditam topografias variadas dissimulando a construção na paisagem, ora criam acidentes geográficos artificiais em locais originalmente planos. Em todos os casos, se fundamentam em pelo menos três características conceituais não excludentes entre si [2]:
1. A utilização de geometrias complexas para reforçar o caráter público e aberto do edifício com maior continuidade com o espaço urbano adjacente;
2. A interpretação ou reinvenção da topografia pré-existente como fato gerador do projeto, definindo com isso construções menos geométricas e mais topológicas;
 3. A síntese ?de uso, construção e forma ?entre edifício e paisagem, reduzindo ?e em alguns casos eliminando quase completamente ?a diferenciação entre ambos.

A primeira das estratégias gerou as galerias rampadas ao nível térreo do Edifício Copan (Oscar Niemeyer, 1950) que, recusando a solução racionalista de construção mais simples e econômica de conformar planos horizontais interligados por rampas e escadas aos modos do  padrão definido pela Maison Domino de Le Corbusier, define todo o piso dos percursos públicos em um plano inclinado, escalonando as lojas ao seu redor, o que promove uma continuidade natural com os diferentes níveis das vias públicas adjacentes. Essa complexa ope­ração geométrica e construtiva reforça o caráter público e aberto das áreas comerciais, radicalizando a integração entre público e privado que a arquitetura moderna propunha. Utilizando os mesmos artifícios e com o mesmo objetivo, diversas obras do arquiteto holandês Rem Koolhaas reeditam o racionalismo modernista através de planos inclinados contínuos que promovem novas possibilidades de relação entre público e privado, bem como entre os espaços internos do edifício. Isso aparece nas rampas do Kunsthaal de Rotterdam, Holanda (1992), que promovem uma intencional sobreposição entre o percurso público de interligação entre os níveis do parque e da avenida e os espaços internos do edifício, obliterando os limites entre público e privado em uma complexa operação construtiva que rearticula os espaços públicos adjacentes. Essa radical continuidade entre planos distintos promovida por uma exploração de geometrias complexas construtivamente definidas pela justaposição de planos inclinados aparece ainda no projeto para o concurso da Biblioteca Jussieu (1993). Com o mesmo objetivo de diluir a distinção entre diferentes níveis e reforçar a continuidade entre espaços e seu uso público, o projeto vencedor do concurso para o Terminal Marítimo de Yokohama, Japão (Foreign Office Architect’s  – Farshid Moussavi e Alejandro Zaera-Polo, 1995-2002) [3] utilizou o potencial que os modelos tridimensionais computadorizados apresentavam para a criação das complexas articulações topográficas entre os distintos planos de uso, ordenando fluxos e reforçando percursos públicos naturalmente interligados sem a utilização de escadas rolantes ou elevadores. A topografia artificial construída em Yokohama tem ainda a virtude de criar um espaço público aberto sobre o terminal que complementa a estrutura urbana pré-existente, promovendo uma continuidade com o parque urbano vizinho.

A preocupação em reforçar a continuidade com o espaço urbano orientou a elaboração de um dos mais emblemáticos projetos brasileiros na criação de uma topografia artificial: o Pavilhão Brasileiro na Feira Internacional de Osaka (Paulo Mendes da Rocha e equipe, 1969-70) [4]. Este projeto sintetiza valores específicos da Escola Paulista, fortemente influenciada por Vilanova Artigas, como a definição da grande cobertura que abriga todos os elementos e espaços do programa e a exploração plástica do profundo co­nhecimento construtivo que a viabiliza materialmente [5]. Outro importante tema, caro a Artigas, é a abertura irrestrita que caracteriza o espaço interno. Para reforçar essa integração, dois artifícios são adotados: o primeiro, a aplicação nas áreas pavimentadas do pavilhão do mesmo material das calçadas adjacentes; o segundo, que mais nos interessa aqui, a ocultação de todos os necessários espaços fechados e volumes construídos ?sanitários, salão do Itamarati, auditório ? por sob colinas artificiais gramadas que tocam suavemente a cobertura em três de seus quatro pontos de apoio. Essa estratégia transforma os possíveis objetos edificados em paisagem artificial, reforçando a prevalência do espaço público e aberto e fazendo da intervenção topográfica fato gerador do projeto, a constituir rica oposição com a cobertura tecnologicamente edificada.

Esta oposição entre um elemento construído e um vazio criado pela ocultação de parte do volume edificado em uma solução integrada à topografia foi retrabalhada inúmeras vezes por Oscar Niemeyer, tendo sido mais enfaticamente explorada na Sede do Partido Comunista Francês (1965). A fim de conformar o vazio frontal aos modos de uma praça, o grande Salão da Classe Operária foi rebaixado, e superfícies rampadas de geometria complexa promovem a articulação entre os planos da calçada e o topo da cúpula visível desde a rua. No espaço interno semi-enterrado, o arquiteto também faz uso dos planos inclinados para promover uma articulação mais sutil entre as áreas de chegada e o grande salão.

Recentemente, a Biblioteca de Delft (Mecanoo, 1993-98) [6] explora a conformação topográfica como estratégia para a preservação do espaço aberto de uso público. A fim de preservar o vazio gramado que o terreno destinado ao edifício conformava, e para evitar a polaridade com o grande volume edificado do auditório vizinho, projetado pelos arquitetos Van der Broek e Bakema nos anos 60, foi criada uma extensa laje gramada de cobertura ascendente que dissimula a presença de grande parte da massa edificada para quem chega desde o auditório e conserva o uso público como praça, construindo uma paisagem artificial que integra as três características acima relacionadas.

Na produção brasileira recente, a Escola Guignard (Gustavo Penna, 1989-90) e o projeto para a Sede da Filarmônica Afro-Brasileira (Ângelo Bucci, 2004 ?vide projeto em MDC 1) partem da interpretação inventiva da variação da topografia para gerar as articulações espaciais internas e para potencializar a continuidade com o espaço público. A primeira recria o lugar oferecendo uma praça gramada aberta ao espaço urbano, por sobre o auditório, reforçando o caráter público do edifício. A segunda articula o percurso público através da exploração de um grande plano de inclinação inversa à variação da topografia que cria o espaço interno necessário através de uma inserção na paisagem ao mesmo tempo rigorosa e complexa, que recupera os melhores momentos da arquitetura moderna brasileira numa evolução nítida do repertório formal geométrico de forte inspiração miesiana que a arquitetura paulista tem apresentado, em decorrência da depuração do repertório de Vilanova Artigas elaborada em especial por Paulo Mendes da Rocha.

Para além de simplesmente promoverem uma reedição da conformação topográfica do lugar, estas intervenções apresentam, em sua maioria, um esforço de transformação das relações entre os domínios público e privado, implantando edifícios de dimensões significativas sem eliminar espaços e percursos públicos e criando novos espaços públicos complementares à estrutura urbana existente.

A segunda estratégia aparece de modo mais enfático na proposição não construída para o Centro Espiritual dos Dominicanos em Sainte-Baume, França (Oscar Niemeyer, 1967), em que o arquiteto inventa um processo de construção inusitado que executa elevações topográficas sobre as quais se concretam lajes de conformações não geométricas. Uma vez edificadas, seria retirada a terra sob as lajes e espaços conformados como cavernas surgiriam [7]. Algo semelhante na forma final não geométrica foi recentemente proposto pelo grupo holandês MVRDV para o pavilhão de verão da Serpentine Gallery (2005), em Londres: uma colina artificial que encobre a antiga edificação da galeria através de um aparato construtivo oneroso e de difícil execução que não se ergue em função da criação de um espaço arquitetônico, mas como uma frívola manifestação da novidade: o evento em que, passada a surpresa inicial de se ver uma montanha onde antes havia uma casa, e passado o espanto de encontrar a mesma casa no interior da montanha, resta apenas esperar desmontá-lo e permitir que a vida volte ao seu curso natural.

Em São Paulo, o racionalismo da escola local permitiu o surgimento de algumas exceções. Um bom exemplo é a Residência Sigrist (Eduardo de Almeida,1973-76) [8] que traz uma inventiva intervenção na paisagem que oculta quase totalmente o volume edificado, mas demarca a presença do artefato humano pelo rigoroso jogo de aberturas geometricamente dispostas no plano inclinado que configura a cobertura gramada da edificação. Nesta residência, a solução do extenso plano inclinado gramado favorece a implantação da residência em terreno em aclive sem a tradicional, e por vezes agressiva, diferenciação entre volume e paisagem. Para isso, o terreno inclinado, cortado em patamares escalonados para abrigar os espaços internos habitáveis da residência, tem sua conformação original recuperada pela inserção radical da laje inclinada. As aberturas visíveis no plano permitem não apenas a qualificação ambiental dos espaços internos ?ventilação e iluminação ? mas também configuram terraços abertos que conformam extensão daqueles espaços.

A estratégia utilizada por Eduardo de Almeida reaparece nos anos 80 na obra do argentino Emilio Ambasz, em uma singela academia de ginástica do arquiteto espanhol Carlos Ferrater (1995), no projeto da Cidade da Cultura da Galícia, em Santiago de Compostela, Espanha (Peter Eisenman, 1999) [9] e em algumas soluções de grande força mimética com a paisagem propostas para o Concurso do Museu Egípcio, na cidade do Cairo (2004). Eisenman argumenta que os edifícios projetados por ele para a Cidade da Cultura da Galícia estabelecem um novo tipo de tecido urbano na medida em que “estão literalmente encaixados no terreno para que a figura seja uma fusão das construções e da topografia?[10]. Para isso, cada edifício define volumetrias onduladas que complementam a topografia e recriam o topo da colina sobre a qual se implanta o conjunto.

Ainda que não resultando em geometrias topológicas, a exploração de variações artificiais na topografia permitiu a Lucio Costa implantar a Rodoviária de Brasília (1957) no cruzamento dos dois eixos, reduzindo sua importância como edifício e articulando a extensa construção como complemento da infra-estrutura viária da capital, mais integrado à paisagem urbana. Essa mesma solução foi adotada por Oscar Niemeyer no terrapleno da Praça dos Três Poderes (1958), rebaixando o trecho central do gramado para permitir a implantação do conjunto edificado do Congresso Nacional, que o arquiteto explica como um modo de integrar visualmente o edifício e a praça dos Três Poderes, dele distanciado, e especialmente como estratégia para acentuar a maior importância hierárquica das cúpulas em relação ao conjunto [11].

Esta relação indissociável entre edifício e paisagem, que se verifica em Brasília, é notável também na Casa de Canoas (Oscar Niemeyer, 1953), em que toda a parte íntima se oculta por sob uma plataforma que diferencia e qualifica os espaços coletivos da casa, extraindo da variação topográfica e da pré-existência de uma rocha no terreno as premissas de sua ordenação espacial.

No panorama internacional, um último exemplo que melhor explora a criação de uma nova topografia através de soluções construtivas complexas visando uma complementação da paisagem e evitando a dicotomia entre objeto construído e território é o Museu Paul Klee, em Berna, Suiça (Renzo Piano, 1999) [12]. Renzo Piano, arquiteto cuja obra ressalta a preocupação tectônica pela busca da expressão plástica do edifício através das suas articulações construtivas, projeta no Museu Paul Klee uma síntese entre a paisagem e a construção através de um rigoroso esquema de arcos em treliças metálicas reversas que constrói as ondulações artificiais e abriga três grandes vãos correspondentes às três diferentes atividades principais da instituição. Segundo Piano trata-se de “um museu que será ele mesmo uma escultura, uma homenagem ao artista e seu trabalho. O museu se integrará à topografia, tomando a forma das montanhas ao seu redor. (…) Assim, o museu adotará a exata forma das montanhas, integrando-se ao máximo ao campo de modo a não perturbar o sentido de beleza e de ausência de limites evocado pelas montanhas?[13]. A descrição do arquiteto revela a preocupação em atingir dois objetivos aparentemente antagônicos, a monumentalidade escultural que represente a instituição e homenageie o artista, e a preservação da integridade da paisagem natural, evitando a configuração de um artefato edificado que se oponha à bela topografia existente.

O caráter antecipador que se verifica nos diversos exemplos apresentados da arquitetura moderna brasileira pode, por um lado, contribuir para evidenciar um aspecto de nossa produção que tem exercido influência, direta ou indiretamente, nas vanguardas contemporâneas internacionais. Por outro lado, revela a maior complexidade com que os arquitetos brasileiros trataram a relação entre edifício e paisagem, edi­fício e espaço urbano, soluções construtivas e suas repercussões na relação entre os domínios público e privado. A criação de uma topografia artificial ressalta a mesma interpenetração entre espaço interno e externo, tipicamente moderna, que é elaborada nos  pilotis de Le Corbusier, nos planos livres de Frank Lloyd Wright e na transparência radical  de Mies van der Rohe. A complexificação das respostas da arquitetura brasileira revela, ainda, a importante flexibilização dos dogmas do funcionalismo e do racionalismo modernistas, para o que contribuiu a liberdade formal reclamada por Oscar Niemeyer desde a Pampulha. Esse aparente relaxamento em relação ao padrão dominante no panorama da arquitetura moderna internacional pode ser ainda creditado ao “amolecimento?ou “adoçamento?do rigor e dogmatismo que caracterizaram todos os momentos em que se processou um transplante cultural forçado, tanto no neoclassicismo como no modernismo, como sugeria Lucio Costa [14]. Por último, esse aspecto pioneiro e inovador, anos à frente de desdobramentos semelhantes nos países desenvolvidos, vem ressaltar a importância do estudo cuidadoso da produção da arquitetura brasileira dos anos 40 aos 70 como fundador de uma tradição que reúne um grande conhecimento da construção associado à liberdade plástica não comum nos círculos racionalistas europeus e norte-americanos e que pode gerar desdobramentos locais da nossa própria arquitetura, valorizando nossas especificidades e reduzindo a permanente dependência em relação à produção internacional.

notas

1.     O assunto tem sido recorrente no panorama da arquitetura contemporânea internacional, em geral associado a configurações que desconsideram as especificidades e limitações relacionadas à construção e se mantêm em um âmbito de especulação virtual. Foi abordado como um dos subtemas da Bienal de Veneza em 2004. Sobre isso, ver TEIXEIRA, Carlos M. “Sobre as Gôndolas da Corderie ?9ª Bienal Internacional de Arquitetura de Veneza ?Metamorph? Arquitextos, Textos Especiais, dezembro de 2004. In: <//www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp272.asp&gt;. Acesso em 03.01.2005.
2.     As características relacionadas decorrem de um esforço metodológico de diferenciação entre sutis estratégias e, naturalmente, se sobrepõem ou interpenetram. Em geral, as três características apontadas têm em comum a exploração de geometrias complexas que se aproximam mais de conformações topográficas do que de disposições espaciais arquitetônicas convencionais para, em última instância, promover ou uma qualificação da inserção do edifício na paisagem, ou a valorização da continuidade do espaço urbano evitando a oposição entre paisagem e objeto construído, ou ainda para promover articulações espaciais internas mais complexas que obliteram a distinção clássica entre público e privado.
3.     Para conhecimento detalhado do projeto, ver memorial e apresentação no site dos arquitetos. <//www.f-o-a.net/flash/&gt;. Acesso em 01.01.2005.
4.     Integram a equipe: Flávio Motta, Júlio Katinsky, Ruy Ohtake, Jorge Caron, Marcelo Nitsche e Carmela Gross.
5.     O arquiteto explica a origem da idéia: “Ali em Osaka (…) o que me ocorreu foi que se fizesse menção ao significado mítico da cobertura. (…) A cobertura é uma peça fundamental da arquitetura, seja ela uma cúpula de Bernini, seja ela um telhadinho camponês. Assim, com a ação que instala uma cobertura primordial num largo território, este passa, agora, a constituir um espaço humano, marcado e configurado pelo homem. (…) Imaginei uma cobertura primordial e excelente. Emblemática, digamos assim. Significativa ao extremo. Pensei no teto da nossa FAU-USP (…) feita pelo Artigas.?In: PIÑON, Helio. Paulo Mendes da Rocha. São Paulo: Romano Guerra Editora, 2002, p.39.
6.     Para conhecimento detalhado do projeto, ver memorial e apresentação no site dos arquitetos. <//www.mecanoo.com/html_project.php?PKY_OBJECTOID=20&taal=EN&ILL=1&gt;.
7.     O próprio arquiteto descreve o processo construtivo imaginado para Sainte Baume e sua estreita relação com arquétipos de abrigo do cristianismo: ”Um dia fui procurado pelos dominicanos de Saite-Baume. Queriam que projetasse um conjunto compreendendo dormitório, capela, locais de encontro ?e falavam de coisas antigas, antiqüíssimas, de abrigos naturais onde a religião cristã começou a surgir. E isso me levou a uma arquitetura tão diferente que vale a pena lembrá-la. Primeiro, seria construir com terra os volumes desejados. Depois, cobri-los com uma laje de concreto. E, com a retirada da terra, a construção estaria concluída.?NIEMEYER, Oscar. Minha arquitetura 1937-2004. Rio de Janeiro: Revan, 2004, p.203.
8.     In: XAVIER, Alberto. LEMOS, Carlos. CORONA, Eduardo. Arquitetura Moderna Paulistana. São Paulo: Pini, 1983, p.175.
9.     Para conhecimento do projeto, ver apresentação no site do arquiteto.<//www.eisenmanarchitects.com&gt;.
10.     “Los edificios están literalmente encajados en el terreno? apunta, “para que la figura sea una fusión de las construcciones y de la topografía? [tradução do autor]. Descrição de Peter Eisenman sobre o projeto, apud HERMIDA, Xose. “Peter Eisenman y una Ciudad de la Cultura en España? In: <//1999.arqa.com/informa/eisenman.htm&gt;. Acesso em 01.01.2005. Em outra situação, esclarece: “Ao invés de conceber o terreno como uma base contra a qual os edifícios de elevam como figuras, criamos uma situação em que o chão se eleva para se tornar uma figura, os edifícios podem existir dentro do chão. É um novo tipo de tecido urbano.?(Instead of the ground’s being conceived as a backdrop against which the buildings stand out as figures, we generate a condition in which the ground can rear up to become figure, the buildings can subside into ground. It is a new kind of urban fabric.) [ tradução do autor]. Ver: “Projects of interest? In: <//www.archpedia.com/Projects-Peter-Eisenman_01.html&gt;. Acesso em 01.01.2005.
11. “Mas a idéia de que o Congresso deveria se integrar na praça me preocupava, o que explica ter mantido a cobertura desse palácio no nível das avenidas, permitindo aos que se aproximassem ver, por cima dela, entre as cúpulas projetadas, a Praça dos Três Poderes da qual esta fazia parte. E com essa solução as cúpulas do Senado e da Câmara se fizeram mais imponentes, monumentais, exaltando a importância hierárquica que no conjunto representam? NIEMEYER, Oscar. Minha arquitetura 1937-2004. Rio de Janeiro: Revan, 2004, p.179-181.
12. Para conhecimento detalhado do projeto, ver memorial e apresentação no site do Renzo Piano Building Workshop. <//rpbw.com&gt; Acesso em 03.01.2005.
13. A museum which will be a sculpture in itself, an homage to the artist and its work. The museum will integrate itself into the topography, taking the shape of the neighbouring hills.(…) Thus the museum will take the exact shape of the hills, while integrating with the countryside as closely as possible so that the sense of beauty and boundlessness evoked by the mountains is not disturbed. [tradução do autor]. Ver descrição completa no site do arquiteto: <//www.rpbw.com/&gt;
 14. Cf. COSTA, Lucio. “Presença de Le Corbusier? In: Lucio Costa: Registro de uma vivência. São Paulo: Empresa das Artes, 1995, p.146-147.

carlos alberto maciel (1974)
Arquiteto e Urbanista (EA-UFMG – 1997) e Mestre em Teoria e Prática de Projeto (EA-UFMG – 2000),  professor no Unicentro Izabela Hendrix, autor de diversos projetos e obras destacados em premiações como o 3o, 4o , 6o e 7o Prêmios Jovens Arquitetos (1997-1999-2004-2005), a 4a Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo (1999), o 4o Prêmio Usiminas Arquitetura em Aço ?Centro de Arte Corpo (2001), a Premiação do Instituto de Arquitetos do Brasil ?São Paulo (2004), entre outros. Possui escritório próprio desde 1996.

contato: carlosalberto@arquitetosassociados.arq.br | www.arquitetosassociados.arq.br

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Residência RP - MGAlexandre Brasil | Carlos Alberto Maciel

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A PERTINÊNCIA DA FORMA
E A POÉTICA DA CONSTRUÇÃO


Ano I . N.1 . jan.2006 . ISSN – 1809-4643

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Editorial

Mdc tem por objetivo refletir sobre a produção contemporânea brasileira de arquitetura, buscando identificar tanto traços comuns e pontos de contato, diferenças e contradições. É através do mapeamento de convergências e divergências que se discute o que poderiam ser chamados “denominadores comuns” nessas arquiteturas. A partir da generosa contribuição do arquiteto Álvaro Puntoni, chegamos ao depoimento de Affonso Eduardo Reidy dado a Alfredo Brito e Ferreira Gullar para o Inquérito Nacional de Arquitetura, no qual sugeria a existência de um denominador comum à produção arquitetônica moderna brasileira. Em sua argumentação, Reidy foi capaz de enumerar com precisão um conjunto de fatores que constituiriam esse denominador.

A busca por pontos em comum em obras e projetos da produção brasileira recente não tem por objetivo a eleição de modelos a serem seguidos, mas estabelecer uma discussão a partir de alguns exemplos que conseguem furar o cerco da massificação cultural e das imposições mercadológicas e econômicas, operando no sentido de estabelecer ideais e objetivos compartilhados.

Uma das características que fundam a arquitetura moderna é a intrínseca relação entre a forma final do edifício e as suas determinações construtivas, regidas por um princípio de economia que remete ao conceito vitruviano do decoro. A busca de uma pertinência da forma, como argumenta Edson Mahfuz, é um fundamento que pode orientar a produção arquitetônica para respostas mais efetivas aos problemas contemporâneos, evitando a frivolidade, a superficialidade e o supérfluo, tão presentes nas produções recentes, em especial naquelas regidas pelas demandas consumistas do mercado. Para além da excessiva subjetividade que tem caracterizado os aportes teóricos recentes, raramente voltados para as questões da construção, procura-se aqui restituir ao conhecimento da técnica sua importância como premissa e fundamento da ação do arquiteto. Interessa-nos, aqui, não a criação formal gratuita baseada na subjetividade do arquiteto criador, mas a busca por padrões construídos que ampliem a qualidade dos espaços edificados para a vida cotidiana, elaboradas criticamente pelo arquiteto-construtor.

André Luiz Prado de Oliveira
Bruno Luiz Coutinho Santa Cecília
Carlos Alberto Maciel

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Casa do Baile . Belo Horizonte
11 de março de 2006 . 16h



Abertura: Carlos Alberto Maciel
Palestra: José Eduardo Ferolla
11 de março de 2006 . 16h



Palestra: Ascanio Merrighi
11 de março de 2006 . 16h30



Palestra: Edson Mahfuz
11 de março de 2006 . 17h



Palestra: Angelo Bucci
11 de março de 2006 . 17h40



Debate
11 de março de 2006 . 18h30


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Carlos Alberto Maciel

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[1]

A tentativa de implantação da cultura européia em extenso território, dotado de condições naturais, se não adversas, largamente estranhas à sua tradição milenar, é, nas origens da sociedade brasileira, o fato dominante e mais rico em conseqüências. Trazendo de países distantes nossas formas de convívio, nossas instituições, nossas idéias, e timbrando em manter tudo isso em ambiente muitas vezes desfavorável e hostil, somos ainda hoje uns desterrados em nossa terra. Podemos construir obras excelentes, enriquecer nossa humanidade de aspectos novos e imprevistos, elevar à perfeição o tipo de civilização que representamos: o certo é que todo o fruto de nosso trabalho ou de nossa preguiça parece participar de um sistema de evolução próprio de outro clima e de outra paisagem.

Sérgio Buarque de Holanda [2]

A quantas anda a produção arquitetônica brasileira contemporânea?

Uma apreciação breve da paisagem edificada das nossas cidades indica que há muito arquiteto e pouquíssima produção relevante. Dados sobre a profissão no mundo [3]  sugerem que estamos diante de um problema estrutural, consolidado e praticamente irreversível: o Brasil é um dos países com maior número de arquitetos registrados (80.000, superados apenas por economias dominantes como Japão – 290.000, Estados Unidos – 110.000, Alemanha – 109.461 e Itália – 99.344). Além disso, apresenta o maior número de escolas de arquitetura do mundo (135, contra Estados Unidos – 116, Índia – 106, Alemanha – 72 e Reino Unido – 43), o que significa que a quantidade de arquitetos tende a crescer ain-da mais rapidamente.  Soma-se a isso o fato de que a nossa economia não favorece o investimento na construção, o que fica explícito ao se considerar que o PIB per capita brasileiro (US$7.600) nos coloca no modesto 48º lugar em comparação aos demais países, imediatamente abaixo da Costa Rica, Lithuania, Botswana, Rússia, Malásia e México.

Logo, a associação explosiva entre grande número de profissionais, crescimento progressivo de graduandos, pouco dinheiro investido na construção, massificação do ensino e banalização de determinados setores da profissão, facilmente substituídos pelo trabalho de engenheiros e decoradores, vem confirmar a progressiva perda de valor do profissional arquiteto e urbanista na sociedade brasileira contemporânea. Podemos trabalhar para reverter essa morte anunciada da profissão? Será possível recuperar o respeito e a credibilidade diante da sociedade de que gozavam os arquitetos brasileiros na metade do século XX?

Por um lado, da regulação da prática profissional, parece inócuo, ainda que necessário, o estabelecimento de procedimentos protecionistas ou filtros de acesso ao mercado, como o discutido exame de ordem. Por outro lado, do ensino e da qualificação do profissional, o forte estímulo das instâncias públicas em privatizar e massificar o ensino superior, tanto pela autorização de funcionamento de numerosos cursos particulares, quanto pelo corte de investimentos nas universidades públicas, e ainda pela redução das cargas horárias mínimas para a graduação, vem ampliar a defasagem da formação nos novos arquitetos, se comparada àquela dos precursores modernos, em que o conhecimento da cons-trução era amplamente dominado.

Para além de vaidosa erudição ou revivalismo ingênuo, buscar compreender os conceitos fundadores da prática arquitetônica nos seus momentos virtuosos pode se configurar como um ato de sobrevivência. Uma vez superada a situação de risco, essa busca pode constituir uma base mais consistente para a construção de um projeto coletivo que amplie a relevância das respostas que os arquitetos têm dado à sociedade. Passada a euforia da pós-modernidade na arquitetura, que contribuiu para agregar complexidade à abordagem do projeto, em especial na consideração das especificidades do lugar e das culturas locais, verifica-se a retomada de um caminho silencioso de estudo de nossas tradições construtivas especialmente vinculadas à produção moderna, de modo a fundamentar a ação dos arquitetos em um conhecimento da construção verdadeiramente pertinente e adequado ao nosso clima, ao nosso modo de vida, à nossa economia e às possibilidades técnicas e materiais, tão variados ao longo de extenso território [4].

Nesse sentido, vale reconhecer as características e estratégias exemplares que os momentos notáveis da arquitetura brasileira apresentaram. Em pelo menos dois momentos, na arquitetura colonial e na arquitetura moderna, verifica-se um grande desenvolvimento das soluções a partir da compreensão e interpretação das limitações e possibilidades da técnica, dos materiais, dos modos de vida e das especificidades do lugar e do tempo, apresentando uma espécie de acomodação bem sucedida do transplante cultural de que somos resultado. Comprova esta assertiva o fato de que foram esses períodos os responsáveis por todos os conjuntos urbanos e edifícios brasileiros eleitos como Monumentos da Humanidade: do Barroco, Ouro Preto e Diamantina são os mais relevantes; do Modernismo, Brasília [5].

Em tempos distintos, mas operando sobre princípios semelhantes, a arquitetura colonial e a arquitetura moderna brasileiras apresentaram pelo menos três fundamentos comuns:

1. O conhecimento da construção como fato gerador da obra, ou o domínio de procedimentos construtivos pertinentes ao lugar e ao tempo, aplicados não como discurso técnico ou formal, mas como resposta a problemas do cotidiano;
2.    O decoro, ou a ausência de ornamentos e a expressão da arquitetura através da exploração plástica do mínimo de meios materiais imprescindível para a integridade física da construção, assegurando aos edifícios, como disse Lucio Costa, uma “saúde plástica perfeita” [6] ;
 3.    A prevalência do público, ou a valorização do lugar e do edifício público, como res publica, hierarquicamente mais importante e mais relevante do que os edifícios privados.

Os três aspectos pressupõem, em conjunto, um modo de fazer ideologicamente comprometido com a construção de suportes para a vida cotidiana, de adaptação crítica dos padrões transplantados dos modelos europeus, de superação das limitações locais e estabelecimento de um estágio civilizatório diferenciado em relação ao anterior à ação de construção. Isso pode ser identificado no Barroco através da superação da natureza selvagem e a conformação de um espaço urbano em que o lugar público e o edifício público são hierarquicamente mais importantes e por isso material e construtivamente diferenciados e, na modernidade, no esforço de transformação de um país rural e de economia agrária em um país urbano e industrializado, em que a arquitetura apresentou um papel antecipador de impulsionar a indústria para o desenvolvimento de novas técnicas e materiais que viabilizassem as soluções propostas.

Entretanto, se considerarmos que a grande virtude da Modernidade foi o amplo estabelecimento de um novo patamar civilizatório nas sociedades em que as transformações foram abrangentes, tanto em decorrência dos processos de industrialização como de uma mudança significativa na consciência crítica das relações de produção dela decorrentes, pode-se dizer, sem reduzir sua inquestionável importância, que o Movimento Moderno no Brasil teve abrangência restrita. Sua presença foi concentrada nos grandes centros urbanos e só atingiu o interior quando ali se encontrava alguma intelectualidade ligada ao pensamento modernista, como em Cataguases, ou quando induzido pela ação política, como em Diamantina. Como conceito, a Modernidade não chegou às massas; como forma, atingiu os mais distantes rincões do país, construindo casas com disposição espacial e técnica construtiva vernacular e a feição modernista do te­lhado borboleta, das lajes sobre colunas tubulares metálicas, das janelas em fita. Modernismo não é modernidade, Lucio Costa já nos alertou [7].

Assim, o argumento de Jürgen Habermas [8]  de que a Modernidade é um projeto inacabado parece fazer mais sentido no contexto brasileiro do que naquele em que foi gestado. Fazê-la chegar às massas continua sendo uma possibilidade fértil que exigirá dos arquitetos um profundo conhecimento da construção, fundado no decoro e no compromisso com o público e o coletivo, e constituído a partir do estudo aprofundado das estratégias e dos conceitos que fundaram a arquitetura moderna brasileira. Esse talvez seja um caminho para contribuirmos, ainda que singelamente, para a construção de um projeto de país que, não obstante todas as suas contradições, possa ampliar a abrangência das virtudes deste bem sucedido transplante cultural que a modernidade na arquitetura brasileira construiu em obras exemplares, ainda que de exceção e que vem sendo retransplantada e readaptada em sentido inverso para alimentar as recentes vanguardas européias.

Transformar a exceção em regra: eis a impossível tarefa para as próximas gerações de arquitetos brasileiros. Modernidade quae sera tamen.

notas

1.   Uma importante abordagem sobre as virtudes do  caráter tardio da modernidade brasileira é apresentada em BRANDÃO, Carlos Antônio Leite. “Modernidade quae sera tamen”. Textos da Disciplina História da Arquitetura do Curso de Mestrado. Belo Horizonte: NPGAU-EAUFMG, 2002. (mimeo). Dele emprestamos o feliz argumento que dá o título a este artigo.
2.    HOLANDA, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil . [coleção Intérpretes do Brasil]. Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 2002, p.945. [1a edição:1937].
3.  Dados extraídos de The Phaidon Atlas of Contemporary World Architecture, Londres: Phaidon, 2004, p.12-15.
4.  Maria Alice Junqueira Bastos enumerou características da produção arquitetônica recente que conformam um “pensamento crítico-teórico nacional” fundado na continuidade com a arquitetura moderna, “valorizando coerência construtiva, adequação climática, adequada relação custo e benefício.” BASTOS, Maria Alice Junqueira. Pós-Brasília: Rumos da Arquitetura Brasileira. São Paulo: Perspectiva/Fapesp, 2003, p.255-264.
5.  Sobre os conjuntos urbanos tombados como Patrimônios da Humanidade, ver: //www.unesco.org.br/areas/cultura/patmundial/pmbrasil/mostra_documento. Acesso em 11/02/05.
6.  COSTA, Lucio. Lucio Costa: Registro de uma Vivência. São Paulo: Empresa das Artes, 1995, p.457.
7.  Idem, Ibidem, p.157.
8.  CF. HABERMAS, Jürgen .”Arquitetura Moderna e Pós-moderna” e também “Modernidade – Um Projeto Inacabado”. In. ARANTES, Otilia Beatriz Fiori. ARANTES, Paulo Eduardo. Um ponto cego no projeto moderno de Jürgen Habermas: arquitetura e dimensão estética depois das vanguardas. São Paulo: Brasiliense, 1992, p.100-149.

carlos alberto maciel (1974)
Arquiteto e Urbanista (EA-UFMG – 1997) e Mestre em Teoria e Prática de Projeto ( EA-UFMG – 2000),  autor de diversos projetos destacados em premiações como o 3º, 4o , 6º e 7º Prêmios Jovens Arquitetos (1997-1999-2004-2005), a 4a Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo (1999), o 4o Prêmio Usiminas Arquitetura em Aço – Centro de Arte Corpo (2001) e a Premiação do Instituto de Arquitetos do Brasil – SP (2004). Possui escritório próprio desde 1996.
contato: carlosalberto@arquitetosassociados.arq.br | www.arquitetosassociados.arq.br

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