{"id":1599,"date":"2009-01-22T10:53:22","date_gmt":"2009-01-22T12:53:22","guid":{"rendered":"http:\/\/puntoni.28ers.com\/?p=1599"},"modified":"2009-02-17T15:19:22","modified_gmt":"2009-02-17T18:19:22","slug":"a-nova-praca-para-brasilia","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/puntoni.28ers.com\/2009\/01\/22\/a-nova-praca-para-brasilia\/","title":{"rendered":"A nova pra\u00e7a para Bras\u00edlia"},"content":{"rendered":"
Sobre o projeto da<\/em> <\/em><\/a>Pra\u00e7a da Soberania.<\/a><\/em><\/p>\n Oscar Niemeyer<\/span><\/p>\n <\/span> O projeto que elaborei de uma nova pra\u00e7a para Bras\u00edlia criou tamanha pol\u00eamica que resolvi defend\u00ea-lo de uma maneira mais detalhada e convincente.<\/span><\/p>\n N\u00e3o vou aos jornais em que alguns, alheios aos assuntos da arquitetura e do urbanismo, v\u00eam a p\u00fablico e, sem dizer nada de novo, participam do debate em curso. Se eles fossem mais informados das modifica\u00e7\u00f5es que ocorrem em todas as grandes cidades, n\u00e3o se envolveriam certamente na discuss\u00e3o que surge sobre a pra\u00e7a por mim proposta para Bras\u00edlia. Deveriam saber que todas as metr\u00f3poles mundiais v\u00eam sofrendo mudan\u00e7as que se justificam, imposs\u00edveis de conter. Estariam cientes das grandes avenidas que Haussmann criou em Paris como coisa inevit\u00e1vel, e, mais ainda, compreenderiam que, se o seu plano urban\u00edstico original fosse mantido, n\u00e3o existiriam nem os Champs Elys\u00e9es nem o Arco do Triunfo. Saberiam que foi necess\u00e1rio, nessa capital, demolir algumas constru\u00e7\u00f5es para se erguer o Jardim das Tulherias. E, na Espanha, valeria considerar o caso de Barcelona, a cidade a se modificar, procurando a aproxima\u00e7\u00e3o do mar por todos desejada.<\/p>\n At\u00e9 Nova York poderia servir de exemplo, com seus arranha-c\u00e9us a dominarem a cidade \u201chorizontal\u201d que antes existia. E, no Rio de Janeiro, deveria ser lembrada uma solu\u00e7\u00e3o que uma cidade tombada n\u00e3o permitiria: derrubando morros e pr\u00e9dios, com o objetivo de abrir uma grande avenida, o prefeito Pereira Passos prop\u00f4s uma reforma que at\u00e9 Le Corbusier elogiou, entusiasmado, em sua passagem por esta capital.<\/p>\n Ah, como s\u00e3o irrecus\u00e1veis e necess\u00e1rias essas modifica\u00e7\u00f5es que se imp\u00f5em nas grandes cidades! Ainda se poderia recordar a influ\u00eancia que o urbanista Agache teve no Rio, propondo que os pr\u00e9dios constru\u00eddos em pilotis no centro da cidade criassem um passeio coberto sobre as cal\u00e7adas.<\/p>\n Diante de tudo isso, me espanta a discuss\u00e3o levantada ao apresentar uma nova pra\u00e7a a ser constru\u00edda em Bras\u00edlia. Em minha \u00faltima visita pude sentir, com clareza, a necessidade de se criar uma pra\u00e7a com escala compat\u00edvel com a capital de um pa\u00eds que se faz t\u00e3o admirado como o nosso. E \u00e9 meu direito e obriga\u00e7\u00e3o conceb\u00ea-la e prop\u00f4-la.<\/p>\n V\u00eam-me \u00e0 mem\u00f3ria as grandes pra\u00e7as que encontrei por toda a parte \u2014 t\u00e3o importantes e bonitas que, como acontece com todo o mundo, nunca as esqueci. E isso, apenas isso, constitui a minha preocupa\u00e7\u00e3o de arquiteto.<\/p>\n Recordo-me como refleti antes de projetar a nova pra\u00e7a: desde o in\u00edcio de Bras\u00edlia a minha participa\u00e7\u00e3o na aprova\u00e7\u00e3o do Plano Piloto foi tal que me senti mais \u00e0 vontade para agir. E lembro o dia em que o colega presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil me procurou: disse-me que a ideia do instituto era interromper o concurso para o Plano Piloto, em andamento, que esse \u00f3rg\u00e3o \u00e9 que deveria se incumbir do assunto. Ele havia estado com Israel Pinheiro, que, surpreso com essa proposta, lhe pediu que me procurasse. E a nossa conversa foi curta e definitiva, eu a lhe afirmar claramente que encontrariam todos os obst\u00e1culos da minha parte. E, recordando tudo isso, fico tranquilo e feliz: minha resist\u00eancia contribuiu para que o concurso chegasse a termo e para que Lucio Costa tivesse recebido a miss\u00e3o de conceber o urbanismo da cidade.<\/p>\n E para justificar a minha interven\u00e7\u00e3o, fico a lembrar minha atua\u00e7\u00e3o durante esses anos em Bras\u00edlia, inclusive o dia em que deixei o conforto de meu escrit\u00f3rio do Rio, atendendo JK e indo passar meses seguidos naquele ent\u00e3o fim de mundo. Por seu lado, tranquiliza-me sentir a maneira pouco comum com que eu hoje projeto os pr\u00e9dios de Bras\u00edlia. Das import\u00e2ncias recebidas fico apenas com a parte referente \u00e0 concep\u00e7\u00e3o da arquitetura; o resto destina-se aos meus colegas escolhidos para o desenvolvimento dos projetos.<\/p>\n E, pouco a pouco, fui constatando que eu, mais do que qualquer um, estava em condi\u00e7\u00f5es de propor essa pra\u00e7a a meu ver importante para a capital do pa\u00eds.<\/p>\n Lembro que, quando a discuss\u00e3o sobre esse projeto teve in\u00edcio, Maria Elisa Costa, filha de Lucio, veio ao meu escrit\u00f3rio, espontaneamente, para me dizer que estava de acordo com a pra\u00e7a projetada, que em nada prejudicava o Plano Piloto, e dela n\u00e3o se ouviria nenhuma cr\u00edtica sobre o meu trabalho. Agradava-me a maneira gentil como me procurara. Dois dias depois, ela me escreveu uma carta, comunicando, para surpresa minha, que mudara de id\u00e9ia: em sua opini\u00e3o, o pr\u00e9dio destinado ao Memorial dos Presidentes prejudicava visualmente a Rodovi\u00e1ria. \u00c9 claro que a atitude correta que teve me procurando ainda me sensibiliza, mas o argumento apresentado n\u00e3o me parece razo\u00e1vel nem forte o bastante para justificar uma revis\u00e3o no projeto: o Memorial dos Presidentes, que n\u00e3o \u00e9 ideia minha, mas uma sugest\u00e3o do pr\u00f3prio governo, est\u00e1 afastado da Rodovi\u00e1ria 400 metros, previsto em pilotis, permitindo a liga\u00e7\u00e3o direta que, como um passeio, se poder\u00e1 fazer entre os dois edif\u00edcios; em nada prejudica a visibilidade do conjunto e, pelo contr\u00e1rio, s\u00f3 valoriza a Rodovi\u00e1ria, integrando-a como acesso mais importante \u00e0 grande pra\u00e7a.<\/p>\n A campanha contra o meu projeto parece continuar. Pessoas at\u00e9 ent\u00e3o desconhecidas se permitem ainda falar sobre o assunto. A constru\u00e7\u00e3o da pra\u00e7a, daqui para a frente, n\u00e3o \u00e9 problema meu; ao governador do Distrito Federal, l\u00facido e competente como \u00e9, caber\u00e1 resolv\u00ea-la.<\/p>\n O que me importa como arquiteto \u00e9, desinteressado nas opini\u00f5es que surgem, defender de uma vez por todas um trabalho que, com tanto entusiasmo, realizei.<\/p>\n Os que contestam qualquer modifica\u00e7\u00e3o em Bras\u00edlia, se fossem mais curiosos e interessados no que ocorre neste velho planeta, saberiam que um dia \u2014 como os cientistas preveem \u2014 as calotas polares poder\u00e3o derreter mais rapidamente, elevando o n\u00edvel dos oceanos a mais de dois metros. E a\u00ed, meus amigos, o que mais importa n\u00e3o \u00e9 uma imposi\u00e7\u00e3o como a que eu vinha comentando, mas a pr\u00f3pria natureza a intervir em todas as \u00e1reas litor\u00e2neas, exigindo da arquitetura e do urbanismo as solu\u00e7\u00f5es indispens\u00e1veis.<\/p>\n E vou mais longe. A degrada\u00e7\u00e3o ambiental come\u00e7a a se agravar, determinando um dia, quem sabe, que as grandes \u00e1reas abertas venham a ser arborizadas, e que as coberturas de concreto, previstas na maioria dos edif\u00edcios, sejam tamb\u00e9m transformadas em terra\u00e7os-jardim cobertos de grama.<\/p>\n E fico a refletir sobre o texto que acabo de escrever, certo de que a vida, o progresso humano e a pr\u00f3pria ci\u00eancia justificam as grandes modifica\u00e7\u00f5es que a arquitetura e o urbanismo v\u00eam propondo em toda a parte.<\/p>\n Oscar Niemeyer <\/a><\/a><\/p>\n <\/a><\/p>\n <\/a><\/p>\n Oscar Niemeyer Texto e imagens publicados com autoriza\u00e7\u00e3o do escrit\u00f3rio de Oscar Niemeyer em Bras\u00edlia.<\/span><\/p>\n Texto conforme publicado em 22\/01\/2009 no Correio Braziliense<\/a>.<\/span><\/p>\n
\n<\/strong>Arquiteto
\n<\/p>\n
\n<\/strong>Arquiteto<\/p>\n