{"id":1612,"date":"2009-01-25T21:17:27","date_gmt":"2009-01-25T23:17:27","guid":{"rendered":"http:\/\/puntoni.28ers.com\/?p=1612"},"modified":"2009-02-04T17:50:35","modified_gmt":"2009-02-04T19:50:35","slug":"praca-da-soberania","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/puntoni.28ers.com\/2009\/01\/25\/praca-da-soberania\/","title":{"rendered":"A Pra\u00e7a de Niemeyer em Bras\u00edlia"},"content":{"rendered":"
Sobre o projeto da Pra\u00e7a da Soberania<\/a><\/em>, de Oscar Niemeyer.<\/em><\/p>\n Glauco Campello<\/p>\n <\/p>\n O projeto de uma pra\u00e7a para Bras\u00edlia na Esplanada dos Minist\u00e9rios entre os dois lados do Setor Cultural \u00e9 a nova surpresa que Oscar Niemeyer nos oferece. No vocabul\u00e1rio arquitet\u00f4nico por ele criado. Vocabul\u00e1rio de precioso refinamento que, ao longo do tempo, se vem tornando cada vez mais sint\u00e9tico e denso, a pra\u00e7a da Soberania \u00e9 exemplo extraordin\u00e1rio.<\/p>\n Tanto por suas caracter\u00edsticas de objeto arquitet\u00f4nico simb\u00f3lico, quanto por sua rela\u00e7\u00e3o inusitada mas n\u00e3o menos arrebatadora com o Eixo Monumental. Nela, apenas dois elementos. Atr\u00e1s, o edif\u00edcio arqueado do Memorial da Presid\u00eancia, com a longa fachada c\u00f4ncava de apenas dois pavimentos voltada para a Esplanada. Na frente, o vulto branco de um obelisco ergue-se de sua base triangular – uma grande sala de exposi\u00e7\u00f5es – e se vai adelga\u00e7ando, deslizando para o alto, apontando para o futuro. Aqui do ch\u00e3o, n\u00e3o podemos saber onde acaba o marco deslumbrante.<\/p>\n A nova pra\u00e7a sonhada por Niemeyer interliga os dois setores culturais para formar um grande espa\u00e7o p\u00fablico a c\u00e9u aberto e o remate da arquitetura monumental da Esplanada. Sob ela, estacionamento para 3 mil ve\u00edculos. Por tr\u00e1s dela, a Plataforma Rodovi\u00e1ria, que se integra ao conjunto e mant\u00e9m as fun\u00e7\u00f5es relacionadas com o afluxo da popula\u00e7\u00e3o ao centro da cidade e articula\u00e7\u00e3o do tr\u00e1fego de ve\u00edculos, no seu papel de grande r\u00f3tula vi\u00e1ria. Do mesmo modo como continua a oferecer vis\u00e3o da Esplanada, agora enriquecida com a presen\u00e7a do obelisco.<\/p>\n Se hoje percorro o cal\u00e7ad\u00e3o da Plataforma, tenho diante dos olhos o belo panorama do Eixo Monumental. Entre mim e o Congresso Nacional, um vasto gramado, ocupado, vez por outra, com os enormes palcos provis\u00f3rios dos espet\u00e1culos de massa. No entanto, vendo-o j\u00e1 com meu olhar comprometido, esse canteiro que se estende at\u00e9 a Pra\u00e7a dos Tr\u00eas Poderes parece omitir essa pra\u00e7a insuspeitada, guardando um tom c\u00edvico em seu car\u00e1ter comunit\u00e1rio, de \u00c1gora, e o gesto grandioso, inesquec\u00edvel, da flecha do obelisco. \u00c9 o que, afinal, Oscar Niemeyer nos vem revelar.<\/p>\n Poder-se-ia arguir que o tombamento de Bras\u00edlia n\u00e3o consentiria, no Eixo Monumental, nova constru\u00e7\u00e3o al\u00e9m das previstas. Mas seria argumento t\u00e3o simpl\u00f3rio quanto err\u00f4neo. Simpl\u00f3rio, porque o Eixo Monumental, do lado da Esplanada dos Minist\u00e9rios, est\u00e1 ainda em execu\u00e7\u00e3o. Os projetos para as duas alas do Setor Cultural, recentemente elaborados pelo mesmo arquiteto respons\u00e1vel pelas constru\u00e7\u00f5es existentes desse lado do Eixo, est\u00e3o ainda por se construir na ala norte. E \u00e9 bom lembrar que todos esses projetos foram pensados e concretizados em perfeita correspond\u00eancia com o tra\u00e7ado urban\u00edstico da cidade. Os projetos de Niemeyer surgindo das diretrizes e sugest\u00f5es do Plano Piloto de Lucio Costa. O Plano de Costa enriquecendo-se com as solu\u00e7\u00f5es arquitet\u00f4nicas oferecidas por Niemeyer.<\/p>\n Tudo isso est\u00e1 ainda em processo. O Eixo Monumental n\u00e3o se apresenta ainda em sua configura\u00e7\u00e3o final no trecho correspondente ao Setor Cultural. Seria tolice pensar que as novas propostas do mesmo autor do extraordin\u00e1rio conjunto de edifica\u00e7\u00f5es que caracteriza a cidade e d\u00e1 materialidade ao plano urban\u00edstico tombado viesse com sugest\u00f5es fora de prop\u00f3sito, descaracterizando a pr\u00f3pria obra e os princ\u00edpios do Plano Piloto. O argumento \u00e9 err\u00f4neo do ponto de vista da interpreta\u00e7\u00e3o do tombamento de Bras\u00edlia.<\/p>\n Bras\u00edlia n\u00e3o foi tombada como s\u00edtio hist\u00f3rico. E mesmo as cidades tombadas como s\u00edtios hist\u00f3ricos, como Ouro Preto, Olinda ou Paraty, n\u00e3o est\u00e3o condenadas ao congelamento. Nelas podem surgir constru\u00e7\u00f5es novas em \u00e1reas espec\u00edficas, mediante par\u00e2metros reguladores. Novos equipamentos de conforto podem ser adotados em suas infraestruturas e assim por diante.<\/p>\n Em Bras\u00edlia, alguns objetos arquitet\u00f4nicos foram individualmente tombados, como os pal\u00e1cios projetados por Niemeyer. Sobre eles aplicam-se os rigorosos crit\u00e9rios de salvaguarda da obra original. A preserva\u00e7\u00e3o do plano urban\u00edstico da cidade, que n\u00e3o \u00e9 um objeto material mas um conjunto de normas, crit\u00e9rios e proposi\u00e7\u00f5es, mas que envolve, logicamente, a manuten\u00e7\u00e3o dos elementos f\u00edsicos que caracterizam e fixam esses princ\u00edpios \u00e9 o que se constitui, propriamente, no tombamento de Bras\u00edlia, que \u00e9, pois, de outro tipo, com outras caracter\u00edsticas.<\/p>\n Vale dizer, s\u00f3 indiretamente ele incide sobre os elementos f\u00edsicos da cidade, na medida em que eles exprimem, em definitivo, as configura\u00e7\u00f5es das propostas e crit\u00e9rios contidos no Plano Piloto. O sistema de circula\u00e7\u00e3o, os dois eixos – o Monumental e o Rodovi\u00e1rio -a Esplanada dos Minist\u00e9rios e a pra\u00e7a do governo, as superquadras e as \u00e1reas de vizinhan\u00e7a. Mas, sobretudo, a quest\u00e3o das escalas – a monumental, a residencial, a greg\u00e1ria e a buc\u00f3lica – que, segundo o relat\u00f3rio do tombamento, definem e caracterizam a cidade.<\/p>\n Portanto, do ponto de vista do tombamento da cidade-capital, a civitas, planejada segundo o modelo modernista, como querem alguns, ou, ainda, do ponto de vista do tombamento da cidade-parque, o que se deve preservar em Bras\u00edlia s\u00e3o os princ\u00edpios e concep\u00e7\u00f5es claramente estabelecidos no Plano Piloto, os quais s\u00e3o bem definidos, mas n\u00e3o s\u00e3o nem r\u00edgidos nem engessadores por se tratar justamente do plano de uma cidade, um organismo vivo. Tal como explicou o pr\u00f3prio Lucio Costa ao comentar, no texto de Bras\u00edlia Revisitada, que a determina\u00e7\u00e3o de uso nos setores definidos no plano era apenas uma indica\u00e7\u00e3o de predomin\u00e2ncia, n\u00e3o obrigatoriedade.<\/p>\n No caso da proposta de Niemeyer para a Pra\u00e7a da Soberania, o que ressalta, em primeiro lugar, \u00e9 a quest\u00e3o da escala. Mas n\u00e3o h\u00e1 d\u00favida de que a nova pra\u00e7a, no \u00e2mbito da escala monumental, projetada pelo mesmo autor de tudo o que est\u00e1 \u00e0 sua volta, n\u00e3o pode ser questionada a esse prop\u00f3sito. Em segundo lugar, desponta a sua localiza\u00e7\u00e3o no canteiro central entre as duas alas do Setor Cultural. Isso se explica por si mesmo.<\/p>\n As duas alas de um conjunto de atividades afins tendem a se interligar. O canteiro central que as separa \u00e9 bem extenso. O arquiteto j\u00e1 havia estudado uma liga\u00e7\u00e3o ao n\u00edvel do subsolo, onde se localizariam lojas e outras atividades, com rasgo no jardim para ilumina\u00e7\u00e3o e ventila\u00e7\u00e3o naturais. Com a ideia da pra\u00e7a, a antiga solu\u00e7\u00e3o ficou superada.<\/p>\n A pra\u00e7a estabelece a interliga\u00e7\u00e3o numa escala muito mais adequada, com a vantagem de oferecer atividades nobres, enriquecer a esplanada e a cidade. Al\u00e9m do mais, o obelisco havia de surgir no eixo da esplanada, como nos exemplos mais significativos de todas as arquiteturas.<\/p>\n Glauco Campello<\/strong> Texto publicado com a autoriza\u00e7\u00e3o do autor, conforme publicado em 24\/01\/2009 no Correio Braziliense<\/a><\/span><\/p>\n
\nArquiteto e presidente do Iphan de 1994 a 1998<\/p>\n