{"id":399,"date":"2006-03-31T19:40:43","date_gmt":"2006-03-31T21:40:43","guid":{"rendered":"http:\/\/puntoni.28ers.com\/?p=399"},"modified":"2009-02-04T05:40:51","modified_gmt":"2009-02-04T07:40:51","slug":"arquitetura-moderna-e-o-lugar-uma-nova-topologia","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/puntoni.28ers.com\/2006\/03\/31\/arquitetura-moderna-e-o-lugar-uma-nova-topologia\/","title":{"rendered":"Arquitetura moderna e o lugar: uma nova topologia"},"content":{"rendered":"

\"mdc<\/a>Fl\u00e1vio de Lemos Carsalade<\/p>\n

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<\/p>\n

Uma das discuss\u00f5es mais interessantes sobre o Movimento Moderno na Arquitetura \u00e9 a rela\u00e7\u00e3o dos novos edif\u00edcios com o lugar onde se assentam, o que, \u00e9 claro, remete \u00e0 face p\u00fablica do edif\u00edcio quando esse lugar \u00e9 a cidade. Passado o per\u00edodo mais questionador quando a cr\u00edtica ao Modernismo era excessivamente \u00e1spera \u2013 at\u00e9 mesmo para que a arquitetura pudesse se renovar \u2013 podemos hoje entender melhor que muitas dessas cr\u00edticas n\u00e3o se justificavam da forma como elas foram elaboradas e, nesse caso, inclui-se justamente\u00a0 o problema da rela\u00e7\u00e3o com o lugar.<\/p>\n

Dizia-se que a Arquitetura Modernista desconhecia ou negava o lugar, privilegiando o edif\u00edcio isolado e auto-referente. De fato, a atitude modernista pressupunha os aspectos de inova\u00e7\u00e3o<\/em> (afinal de contas se considerava o \u201cfim da hist\u00f3ria\u201d) e de transforma\u00e7\u00e3o<\/em> (o ideal de se \u201ccorrigir\u201d cientificamente os erros dos edif\u00edcios e cidades), aspectos esses caracter\u00edsticos n\u00e3o apenas da arquitetura, mas da pr\u00f3pria atitude modernizante [1]. Assim, antes de negar<\/em> o lugar, a arquitetura moderna buscava, por um lado, transformar<\/em> o lugar e, por outro, inovadora que era, se estabelecer em contraste<\/em>.<\/p>\n

A nova cidade era o ideal a ser perseguido: novas formas de rela\u00e7\u00e3o do pr\u00e9dio com a cidade. Da\u00ed surgiram as id\u00e9ias do pilotis<\/em>, do descortinamento da paisagem, da redu\u00e7\u00e3o de fronteiras (ou sua atenua\u00e7\u00e3o) entre o p\u00fablico e o privado, enfim uma nova ordem urbana. Na postura modernista era importante que o espa\u00e7o aberto se imiscu\u00edsse entre os pr\u00e9dios, livre, higi\u00eanico, claro. A quest\u00e3o assim colocada adquiria formas pr\u00f3prias quando o lugar dos novos edif\u00edcios n\u00e3o fosse um campo aberto (como a Villa Savoye) ou cidades absolutamente novas (como Bras\u00edlia). A postura modernista com rela\u00e7\u00e3o \u00e0 pr\u00e9-exist\u00eancia assume uma riqueza enorme quando analisada caso a caso: em Belo Horizonte tratava-se de substituir as formas arcaicas dos \u201cneos\u201d e garantir a voca\u00e7\u00e3o moderna da cidade, na avenida Paulista tratava-se de garantir a pujan\u00e7a econ\u00f4mica e a presen\u00e7a forte de cada institui\u00e7\u00e3o (fazendo com que cada pr\u00e9dio fosse necessariamente um indiv\u00edduo), no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, tratava-se de mostrar como a nova est\u00e9tica e a nova tecnologia propiciavam novas formas de se dialogar e valorizar a paisagem local.<\/p>\n

Talvez o sonho final fosse mesmo uma substitui\u00e7\u00e3o completa em busca da nova ordem urbana. Mas no seu processo real de transforma\u00e7\u00e3o das cidades, aquele que o\u00adcorria no dia-a-dia, ao largo das especula\u00e7\u00f5es e ensaios te\u00f3ricos, na pr\u00e1tica profissional c\u00adotidiana, a arquitetura moderna deixou de seu primeiro i\u00adntento de transformar o lugar para buscar n\u00adovas formas de com ele dialogar, n\u00e3o no sentido de respeitar as pr\u00e9-exist\u00eancias e trabalhar de forma harm\u00f4nica (ou similar) mas de re-interpret\u00e1-las, buscar novas formas de rela\u00e7\u00e3o do objeto com o lugar [2].<\/p>\n

Tendo vivido a experi\u00eancia de projetar nos \u00faltimos vinte e cinco anos, a minha pr\u00f3pria obra e pensamento, de certa forma, refletem essa inquieta\u00e7\u00e3o e essa busca de uma nova topologia urbana e, embora n\u00e3o seja a atitude acad\u00eamica mais usual, n\u00e3o resisto \u00e0 tenta\u00e7\u00e3o de examinar esses aspectos na minha pr\u00f3pria obra, impulsionado pelas caracter\u00edsticas livres desta publica\u00e7\u00e3o. De qualquer forma, a experi\u00eancia de quem viveu e projetou nesse tempo pode ser uma fonte interessante de dados para reflex\u00e3o. Assim sendo, selecionei alguns exemplos, muitos deles resultantes de concursos p\u00fablicos e n\u00e3o constru\u00eddos (afinal os constru\u00eddos j\u00e1 est\u00e3o expostos…), para explorar exatamente esse car\u00e1ter p\u00fablico, os quais passo a expor a seguir.<\/p>\n

casa do jornalista<\/h4>\n

Belo Horizonte, 1982 (Fig. 1)
\nArquitetos \u00c2ngela Rold\u00e3o, Flavio Carsalade, Gustavo Penna,\u00a0 Luis Ant\u00f4nio Fontes Queir\u00f3s
\n(1\u00ba\u00a0 lugar em Concurso P\u00fablico)
\nO projeto prop\u00f5e um amplo espa\u00e7o p\u00fablico no pilotis, a \u201cPra\u00e7a da Not\u00edcia\u201d e para tanto tenta minimizar a presen\u00e7a do pr\u00e9dio e refor\u00e7ar a luminosidade da pra\u00e7a, retirando os pilares intermedi\u00e1rios (atrav\u00e9s do v\u00e3o de vinte e cinco metros propiciado pela viga-ponte met\u00e1lica) e pelo p\u00e9-direito de 15 metros do pilotis.<\/p>\n

rede bandeirantes de televis\u00e3o\/sucursal belo horizonte<\/h4>\n

Belo Horizonte, 1981
\nArquitetos Flavio Carsalade e Gustavo Penna
\nO projeto prop\u00f5e uma ampla janela para a cidade, propiciada pelo volume prism\u00e1tico e pela situa\u00e7\u00e3o da avenida Raja Gabaglia, na cumeada da montanha.<\/p>\n

edif\u00edcio sede hemobel laborat\u00f3rio<\/h4>\n

Belo Horizonte, 1985 (Fig. 2)
\nArquitetos Ant\u00f4nio de P\u00e1dua Fialho, Flavio Carsalade e Paulo Henrique Lopes
\nOs planos formadores do edif\u00edcio exploram as possibilidades do lote, de esquina em \u00e2ngulo agudo.<\/p>\n

edif\u00edcio sede do demetr\u00f4<\/h4>\n

Belo Horizonte, 1987 (Fig. 3)
\nArquitetos Ant\u00f4nio de P\u00e1dua Fialho, Flavio Carsalade e Paulo Henrique Lopes
\n(3o lugar em Concurso P\u00fablico)
\nA situa\u00e7\u00e3o do terreno, linear, paralelo ao ribeir\u00e3o Arrudas e \u00e0 cavaleira sobre a cidade,\u00a0 com duas entradas em cada uma das suas extremidades possibilitou a cria\u00e7\u00e3o de uma rua p\u00fablica de pedestres que se beneficiasse do potencial do terreno.<\/p>\n

museu de arte de belo horizonte<\/h4>\n

Belo Horizonte, 1990\u00a0 (Fig. 4)
\nArquitetos Ant\u00f4nio de P\u00e1dua Fialho, Flavio Carsalade e Paulo Henrique Lopes
\n(Participante de Concurso P\u00fablico)
\nA id\u00e9ia chave do projeto foi a cria\u00e7\u00e3o de uma grande superf\u00edcie plana que se estendia ao longo da avenida dos Andradas, criando entre ela e os espa\u00e7os de exposi\u00e7\u00e3o um \u00e1rea intersticial por onde passaria uma grande rampa p\u00fablica de pedestres ligando o viaduto da Floresta \u00e0 pra\u00e7a da Esta\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

parque amilcar vianna martins<\/h4>\n

Belo Horizonte, 1991 (Fig. 5)
\nArquitetos Fernando Ramos, Flavio Carsalade, Gaston Oporto e Jos\u00e9 Eduardo Ferolla
\nDa situa\u00e7\u00e3o topogr\u00e1fica da Caixa d\u2019\u00c1gua do Bairro Cruzeiro, na parte alta da avenida Afonso Pena, resultam, para esta, taludes de fraco apelo visual e pouca conex\u00e3o, para a cidade, uma vista exuberante. O projeto prop\u00f5e, para a avenida Afonso Pena, uma conex\u00e3o forte atrav\u00e9s do elevador e da passarela met\u00e1lica e para seus taludes um tratamento em jardins escalonados que criam uma express\u00e3o pl\u00e1stica mais vigorosa e, para a vista da cidade, um amplo deck de observa\u00e7\u00e3o em balan\u00e7o sobre a montanha.<\/p>\n

parque linear do arrudas<\/h4>\n

Belo Horizonte, 1989 (Fig. 6)
\nArquitetos Carlos Ant\u00f4nio Leite Brand\u00e3o, E\u00adduardo Mascarenhas, Fernando Gontijo R\u00adamos, Flavio Carsalade,\u00a0 Humberto C\u00adarneiro, Jos\u00e9 Eduardo Ferolla, Jurema Marteletto R\u00aduggani, Marcos Em\u00eddio Fonseca
\n(Men\u00e7\u00e3o Honrosa no concurso nacional \u201cBH Centro\u201d para revitaliza\u00e7\u00e3o do centro de Belo Horizonte)
\nA proposta do parque faz \u201ccostura\u201d norte-sul e leste-oeste da cidade rompida pela linha f\u00e9rrea, atrav\u00e9s da liga\u00e7\u00e3o ininterrupta de pedestres desde o pr\u00e9dio da Rodovi\u00e1ria at\u00e9 a Serraria Souza Pinto e centro-bairro pela grande laje que cobre o metr\u00f4 e a\u00ed cria um amplo espa\u00e7o p\u00fablico.<\/p>\n

edif\u00edcio sede ordem dos advogados do brasil de patos de minas<\/h4>\n

Patos de Minas 1996
\nArquitetos Ant\u00f4nio de P\u00e1dua Fialho, Flavio Carsalade e Paulo Henrique Lopes
\nO grande p\u00f3rtico na esquina do terreno triangular cria a interface entre a cidade e a institui\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

memorial do centen\u00e1rio de campo grande<\/h4>\n

Campo Grande\/Mato Grosso do Sul, 1998
\n(Fig. 7)
\nArquitetos Alexandre Brasil,\u00a0 Carlos Alberto Maciel e Flavio Carsalade
\n(Terceiro Lugar no \u201cConcurso nacional para o edif\u00edcio comemorativo dos cem anos da cidade de Campo Grande)\/ Mato Grosso do Sul\u201d \u2013 1998
\nTodo o projeto se baseia na cria\u00e7\u00e3o de um percurso ligando as v\u00e1rias entradas do terreno, onde situa\u00e7\u00f5es arquitet\u00f4nicas e paisag\u00edsticas v\u00e3o ocorrendo em sucess\u00e3o.<\/p>\n

pa\u00e7o cultural da liberdade<\/h4>\n

pra\u00e7a anexa \u00e0 Se-cretaria de Estado da Cultura de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2000
\nArquitetos Alexandre Brasil, Carlos Alberto Maciel e Flavio Carsalade
\nA pra\u00e7a anexa \u00e0s casas que abrigam a Secretaria Estadual da Cultura aproveita terrenos vagos de propriedade p\u00fablica e d\u00e3o dimens\u00e3o p\u00fablica e de percurso urbano \u00e0 eles. n<\/p>\n

refer\u00eancias bibliogr\u00e1ficas<\/h3>\n

ABASCAL, Eunice Helena Sguizzardi. Cidade e arquitetura contempor\u00e2nea: uma rela\u00e7\u00e3o necess\u00e1ria. Texto in Vitruvius, 2005.
\nBERMAN, Marshall. Tudo que \u00e9 s\u00f3lido desmancha no ar. S\u00e3o Paulo: Companhia das Letras, 1988.<\/p>\n

notas<\/h3>\n

1.\u00a0 \u201cSer moderno \u00e9 encontrar-se em um ambiente que promete aventura, poder, alegria, crescimento, autotransforma\u00e7\u00e3o e transforma\u00e7\u00e3o das coisas em redor \u2013 mas ao mesmo tempo amea\u00e7a destruir tudo o que temos, tudo o que sabemos, tudo o que somos. (…) Ser moderno \u00e9 fazer parte de um universo no qual, como disse Marx, \u2018tudo o que \u00e9 s\u00f3lido desmancha no ar\u201d. (BERMAN, 1988, p. 15)
\n2.\u00a0 \u201cO modelo de espa\u00e7o ordenado, tomando a natureza como enquadramento de edif\u00edcios \u201cdispostos no verde\u201d em que uma renova\u00e7\u00e3o formal alimenta-se do ide\u00e1rio iluminista de \u201cf\u00e9 no progresso da raz\u00e3o\u201d veio sendo repensado\u201d (ABASCAL, 2005)<\/p>\n

flavio de lemos carsalade<\/strong>
\nFormado em Arquitetura e Urbanismo pela Escola\u00a0 de\u00a0 Arquitetura\u00a0 da\u00a0 UFMG\u00a0 em\u00a0 1979, Doutorando na Universidade Federal da Bahia \u2013 2003, na \u00e1rea de patrim\u00f4nio cultural, Mestre em Arquitetura pela Escola de Arquitetura da UFMG \u2013 1997, professor da Escola de Arquitetura da UFMG, desde 1982\u00a0 onde exerceu a vice-diretoria no per\u00edodo de 1989\/1991. Atualmente Secret\u00e1rio Municipal de Administra\u00e7\u00e3o Regional Pampulha, Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, tendo atuado como presidente do Instituto Estadual do Patrim\u00f4nio Hist\u00f3rico e Art\u00edstico de Minas Gerais\u00a0 (IEPHA\/MG ), entre 1999 a 2002 e presidente do Departamento de Minas Gerais do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB\/MG) nas gest\u00f5es de 1996\/1997 e 1998\/1999. Atuou ainda como profissional liberal na \u00e1rea de arquitetura e urbanismo e como Professor visitante na \u201cUniversity of Washington\u201d.\u00a0 Arquiteto premiado em v\u00e1rios concursos nacionais de arquitetura.<\/p>\n

contato:<\/strong> flavio.carsalade@terra.com.br<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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