{"id":5183,"date":"2011-05-03T01:49:28","date_gmt":"2011-05-03T04:49:28","guid":{"rendered":"http:\/\/puntoni.28ers.com\/?p=5183"},"modified":"2011-07-19T02:09:59","modified_gmt":"2011-07-19T05:09:59","slug":"a-construcao-de-um-campo-historiografico","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/puntoni.28ers.com\/2011\/05\/03\/a-construcao-de-um-campo-historiografico\/","title":{"rendered":"A constru\u00e7\u00e3o de um campo historiogr\u00e1fico"},"content":{"rendered":"
<\/a><\/p>\n Abilio Guerra<\/p>\n <\/a><\/p>\n [1]<\/a><\/p>\n A historiografia da arquitetura moderna introduzida no Brasil a partir do final da d\u00e9cada de 1920 \u00e9 um fen\u00f4meno recente. Durante d\u00e9cadas imperou a vis\u00e3o presente nos mitol\u00f3gicos Brazil Builds<\/em> (Philip Goodwin, 1943)[2]<\/a> e Modern Architecture in Brazil<\/em> (Henrique Mindlin, pref\u00e1cio de Sigfried Giedion, 1956)[3]<\/a>, que foi repetida de forma t\u00e3o sistem\u00e1tica que se transformou em quase axioma. Os textos de Goodwin e Giedion olhavam para a nova arquitetura a partir de uma perspectiva informada pelos pressupostos te\u00f3ricos e hist\u00f3ricos de Lucio Costa. No entendimento de Costa, a arquitetura moderna brasileira era resultante de dois fatores distintos e complementares: a fus\u00e3o dos princ\u00edpios europeus e dos elementos culturais nacionais; e a criatividade do g\u00eanio nativo, em especial do arquiteto Oscar Niemeyer. H\u00e1 aqui um flagrante condicionamento de um ambiente intelectual que assumiu a identidade nacional como cerne de sua atua\u00e7\u00e3o cultural e art\u00edstica; hegem\u00f4nico no primeiro tempo modernista brasileiro, esse ambiente ocupou tamb\u00e9m posi\u00e7\u00e3o central nos desdobramentos modernos dos anos 1940 e 1950.<\/p>\n A produ\u00e7\u00e3o hist\u00f3rica escassa sobre a arquitetura moderna no Brasil at\u00e9 o in\u00edcio dos anos 1980 \u00e9 resultante, dentre outros fatores, da falta de consist\u00eancia te\u00f3rica e metodol\u00f3gica da pesquisa hist\u00f3rica realizada na universidade \u2013 os raros programas de p\u00f3s-gradua\u00e7\u00e3o ainda n\u00e3o tinham se consolidado \u2013 e do ambiente end\u00f3geno na \u00e1rea de produ\u00e7\u00e3o, em que os envolvidos na realiza\u00e7\u00e3o de obras arquitet\u00f4nicas e sua divulga\u00e7\u00e3o \u2013 arquitetos, fot\u00f3grafos, editores, redatores etc. \u2013 compartilhavam dos mesmos princ\u00edpios e valores a respeito da \u201cboa arquitetura\u201d. N\u00e3o \u00e9 de se estranhar, portanto, que em um ambiente intelectual engessado tenha sido de um estrangeiro, o franc\u00eas Yves Bruand, o primeiro estudo abrangente sobre a carreira da arquitetura moderna em nosso pa\u00eds. Mas, mesmo neste livro fundamental \u2013 Arquitetura contempor\u00e2nea no Brasil<\/em>, publicado em 1981[4]<\/a> \u2013 a pauta que estrutura os argumentos e a pr\u00f3pria l\u00f3gica da evolu\u00e7\u00e3o ainda est\u00e1 embebida do DNA das ideias de Costa.<\/p>\n O livro de Bruand, ele pr\u00f3prio resultado de uma pesquisa de doutorado, sinaliza uma mudan\u00e7a fundamental em dois \u00e2mbitos: pesquisa em p\u00f3s-gradua\u00e7\u00e3o e publica\u00e7\u00f5es peri\u00f3dicas. Na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de S\u00e3o Paulo (FAU USP), pioneira na p\u00f3s-gradua\u00e7\u00e3o em arquitetura no Brasil[5]<\/a>, o curso de mestrado foi criado em 1972, mas ser\u00e1 o de doutorado, estruturado em 1980, que dar\u00e1 novos par\u00e2metros para a pesquisa em hist\u00f3ria, al\u00e9m de formar um expressivo contingente de professores para os cursos de mestrado que ser\u00e3o fundados a seguir em outras universidades p\u00fablicas brasileiras, com especial destaque para a Escola de Engenharia de S\u00e3o Carlos, da USP. Nessa escola, o curso de mestrado em arquitetura remonta a 1971, mas s\u00f3 a partir de 1985, quando ocorre a implanta\u00e7\u00e3o do curso de gradua\u00e7\u00e3o em arquitetura e urbanismo, com a participa\u00e7\u00e3o de professores com mestrado e\/ou doutorado na FAU USP \u2013 dentre eles, Carlos Alberto Ferreira Martins, Carlos Roberto Monteiro de Andrade, Renato Anelli, Agnaldo Farias e Nabil Bonduki \u2013, \u00e9 que se consolida o projeto que resultar\u00e1 na \u00e1rea de concentra\u00e7\u00e3o \u201cTeoria e Hist\u00f3ria da Arquitetura e do Urbanismo\u201d, criada em 1993. Outros cursos de mestrado, como \u00e9 o caso dos implantados na Universidade Federal da Bahia (UFBA) em 1983 e na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em 1987, tamb\u00e9m se beneficiaram da matriz uspiana, mas com menor intensidade, pois neles \u00e9 muito expressivo o n\u00famero de professores com p\u00f3s-gradua\u00e7\u00e3o no exterior. Tal situa\u00e7\u00e3o \u00e9 ainda mais flagrante na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), onde a influ\u00eancia da FAU USP \u00e9 m\u00ednima. O Programa de P\u00f3s-gradua\u00e7\u00e3o em Arquitetura (Propar) foi fundado em 1979 e come\u00e7ou a oferecer cursos de especializa\u00e7\u00e3o em 1980, de mestrado em 1990 e o de doutorado em 2000. Seus mais destacados professores, Carlos Eduardo Dias Comas e Edson da Cunha Mahfuz, realizaram suas p\u00f3s-gradua\u00e7\u00f5es no exterior, assim como diversos dos outros membros do programa. Essa relativa autonomia talvez explique a diversidade do foco das leituras hist\u00f3ricas ali realizadas.<\/p>\n No campo das publica\u00e7\u00f5es peri\u00f3dicas, depois de um interregno de quase uma d\u00e9cada sem revistas de arquitetura relevantes, o quadro ir\u00e1 se reverter nos anos 1980: \u201cNo Brasil\u201d, assinala Hugo Segawa, \u201crevistas como Habitat<\/em> e M\u00f3dulo<\/em> dos anos 1950 e Acr\u00f3pole<\/em> dos anos 1960 (com menos rigor) aproximaram-se das linhas editoriais de tend\u00eancia, como Arquitetura <\/em>refletiu as posi\u00e7\u00f5es da corpora\u00e7\u00e3o nessa mesma d\u00e9cada, at\u00e9 o fenecimento da imprensa de arquitetura no in\u00edcio dos anos 1970. O ressurgimento das publica\u00e7\u00f5es regulares nos anos 1980, com a Projeto <\/em>(a partir de 1979) e AU <\/em>(desde 1985), n\u00e3o marcou a retomada de \u2018revistas de tend\u00eancia\u2019, mas refletiu as incertezas de um pa\u00eds no limiar da redemocratiza\u00e7\u00e3o, o atordoamento p\u00f3s-moderno e a concordata da modernidade brasileira\u201d[6]<\/a>. As duas novas revistas iniciam um processo de profissionaliza\u00e7\u00e3o do jornalismo em arquitetura, com destaque para Ruth Verde Zein, Cec\u00edlia Rodrigues do Santos e o pr\u00f3prio Segawa[7]<\/a>. Na revista Projeto<\/em> daquele per\u00edodo \u00e9 poss\u00edvel encontrar textos jornal\u00edsticos inspirados, em que a intui\u00e7\u00e3o dos articulistas aponta para temas e quest\u00f5es inovadoras, e o in\u00edcio de preocupa\u00e7\u00f5es mais rigorosas do ponto de vista cr\u00edtico e hist\u00f3rico. A t\u00f4nica comum \u00e9 de um entendimento mais cr\u00edtico da arquitetura moderna e de uma maior abertura em rela\u00e7\u00e3o \u00e0s tem\u00e1ticas e po\u00e9ticas arquitet\u00f4nicas contempor\u00e2neas. Em um sentido mais geral, pode-se dizer que nesse momento surge uma consci\u00eancia da historicidade do moderno e as implica\u00e7\u00f5es correspondentes, em especial a possibilidade de se fazer balan\u00e7os, compara\u00e7\u00f5es, ajuizamentos cr\u00edticos etc.<\/p>\n Curiosamente estes dois elementos \u2013 pesquisa e revista \u2013 estiveram presentes simultaneamente em duas unidades da PUC, permitindo que participassem da discuss\u00e3o historiogr\u00e1fica. Ainda nos anos 1980, na falta de uma escola de arquitetura[8]<\/a>, o Curso de Especializa\u00e7\u00e3o em Hist\u00f3ria da Arte e Arquitetura do Departamento de Hist\u00f3ria da PUC-Rio abrigou um grupo de intelectuais de primeira linha, o que possibilitou a experi\u00eancia marcante da G\u00e1vea<\/em>, revista de hist\u00f3ria da arte e arquitetura, cujo primeiro n\u00famero foi publicado em 1984. Ao longo dos anos, participaram como editores e membros do conselho editorial personalidades como Carlos Z\u00edlio, Eduardo Jardim de Moraes, Margareth da Silva Pereira, Jorge Czajkowski, Ronaldo Brito, Jo\u00e3o Masao Kamita, Roberto Conduru e Rodrigo Naves. Na d\u00e9cada seguinte, a PUC-Campinas, gra\u00e7as ao investimento na carreira docente, possibilitou que seus professores se qualificassem com mestrado e doutorado, realizados na FAU USP e no Instituto de Filosofia e Ci\u00eancias Humanas da Unicamp. Essa experi\u00eancia \u2013 que contou com a participa\u00e7\u00e3o dos professores Sophia S. Telles, Luis Espallargas Gimenez, Maria Beatriz de Camargo Aranha, \u00c1urea Pereira da Silva, Vladimir Bartalini, Silvana Rubino e Abilio Guerra \u2013 teve na revista \u00d3culum<\/em>, publicada a partir de 1992, uma de suas express\u00f5es importantes[9]<\/a>.<\/p>\n S\u00e3o os artigos escritos e publicados nesse ambiente intelectual, entrela\u00e7ando jornalismo especializado e pesquisa acad\u00eamica, revistas comerciais e peri\u00f3dicos universit\u00e1rios, que d\u00e3o a base inicial para a forma\u00e7\u00e3o do espa\u00e7o de pesquisa sobre arquitetura moderna brasileira, ou simplesmente do \u201ccampo\u201d, como diria Margareth da Silva Pereira. Desde ent\u00e3o se avan\u00e7ou muito, gra\u00e7as \u00e0 sedimenta\u00e7\u00e3o dos mencionados cursos de p\u00f3s-gradua\u00e7\u00e3o e a cria\u00e7\u00e3o de outros, tanto em escolas p\u00fablicas como privadas, alguns em r\u00e1pido processo de amadurecimento, como \u00e9 o caso dos oferecidos pela PUC-Campinas e Mackenzie. Hoje, portanto, o quadro \u00e9 muito distinto de trinta anos atr\u00e1s, pois j\u00e1 foram realizados uma cobertura tem\u00e1tica de grande amplitude e estudos monogr\u00e1ficos aprofundados[10]<\/a>.<\/p>\n A ideia de publicar esta colet\u00e2nea de artigos, que consideramos fundamentais para a compreens\u00e3o da forma\u00e7\u00e3o da historiografia sobre a arquitetura moderna brasileira, \u00e9 acalentada h\u00e1 alguns anos. O per\u00edodo que nos separa de suas publica\u00e7\u00f5es originais \u00e9 relativamente curto \u2013 o primeiro deles data de 1983 \u2013 e eles continuam presentes nas bibliografias de artigos, mestrados, doutorados, disciplinas etc. Essa constata\u00e7\u00e3o torna inc\u00f4moda a situa\u00e7\u00e3o de quem os reapresenta ao p\u00fablico, pois alguns riscos de interpreta\u00e7\u00e3o equivocada s\u00e3o eminentes. O primeiro deles \u00e9 supor que aqui est\u00e3o apresentados os textos inaugurais<\/em> da constru\u00e7\u00e3o historiogr\u00e1fica da arquitetura moderna brasileira. Para nos antepormos a quem assim considerar, sacamos de empr\u00e9stimo o coment\u00e1rio de Lucio Costa em seu debate epistolar com Geraldo Ferraz, que defendia Gregori Warchavchik como o introdutor da arquitetura moderna no Brasil: \u201cn\u00e3o adianta […] perderem tempo \u00e0 procura de pioneiros \u2013 arquitetura n\u00e3o \u00e9 Far-West<\/em>\u201d[11]<\/a>. Mas, diferente de Lucio Costa \u2013 que desloca astuciosamente a quest\u00e3o ao defender Niemeyer como autor dos princ\u00edpios que norteariam o seu desenvolvimento no pa\u00eds \u2013, n\u00f3s apontamos aqui a dificuldade, e at\u00e9 mesmo a impossibilidade, em detectar pioneirismo de ideias em um ambiente em que o rigor acad\u00eamico ainda n\u00e3o havia fincado ra\u00edzes. Portanto, os textos aqui presentes n\u00e3o s\u00e3o necessariamente os primeiros publicados sobre a quest\u00e3o historiogr\u00e1fica e, seguramente, se beneficiaram do momento prop\u00edcio \u00e0 constru\u00e7\u00e3o do \u201ccampo\u201d. Mas eles s\u00e3o ou os artigos que mais desdobramentos provocaram no debate historiogr\u00e1fico nas \u00faltimas d\u00e9cadas \u2013 em especial, os presentes na parte 1 desta colet\u00e2nea \u2013, ou exemplos interessantes dos desdobramentos de ideias, pressupostos e m\u00e9todos ali contidos.<\/p>\n O segundo risco \u00e9 de considerar os textos selecionados como atuais<\/em>, no sentido que seriam as \u00faltimas elucubra\u00e7\u00f5es sobre os assuntos historiogr\u00e1ficos. N\u00e3o o s\u00e3o, evidentemente. O tempo \u2013 que corr\u00f3i todas as coisas, segundo o velho ad\u00e1gio ovidiano \u2013 n\u00e3o os deixou impunes. Como n\u00e3o podia deixar de ser, mais do que as pretensas verdades dos caminhos e descaminhos da arquitetura moderna brasileira, eles retratam as condi\u00e7\u00f5es materiais e possibilidades intelectuais do per\u00edodo no qual foram produzidos. E os pr\u00f3prios autores \u2013 praticamente todos eles hoje com uma carreira consolidada \u2013 s\u00e3o conscientes disso, como podemos verificar nas suas pr\u00f3prias palavras. \u201cDe minha parte\u201d, diz Sophia S. Telles, \u201cmodifica\u00e7\u00f5es substantivas ocorreram durante esses anos, mais na maneira de ler os projetos \u2013 t\u00e3o fenomenol\u00f3gica, inicialmente \u2013 e muito nas interpreta\u00e7\u00f5es ideol\u00f3gicas e pol\u00edticas, que considero ainda pouco estudadas no nosso caso. Aplicamos as regras dos anos 1980 mais com esp\u00edrito militante do que propriamente universit\u00e1rio, no sentido de conhecer a fundo o que sequer sab\u00edamos suficiente, a arquitetura brasileira, e muito menos a arquitetura moderna em geral\u201d[12]<\/a>. Ou ent\u00e3o, na pondera\u00e7\u00e3o de Carlos Eduardo Dias Comas: \u201cHoje eu seria muito mais cr\u00edtico da interpreta\u00e7\u00e3o do Frampton; relativizaria \u2013 e muito \u2013 a import\u00e2ncia da identidade nacional e do barroco no per\u00edodo 1936-1945, vendo-a mais como parte da ret\u00f3rica de resist\u00eancia antiamericana nos anos 1950\u201d[13]<\/a>. Margareth da Silva Pereira, por sua vez, \u00e9 contundente sobre o quanto seus artigos s\u00e3o tribut\u00e1rios da ocasi\u00e3o: \u201cAmbos os textos revelam meus interesses \u00e0 \u00e9poca pelas quest\u00f5es de mem\u00f3ria coletiva e pelo sentido cultural atribu\u00eddo a conceitos e palavras, o que pode ser definido como uma tend\u00eancia geral nesse per\u00edodo. O significado cultural atribu\u00eddo a palavras como hist\u00f3ria, utopia, natureza, paisagem e, sobretudo, arquitetura, passou a ser o meu foco de interesse naqueles anos, conjugado a um interesse que nunca deixei de ter pelas biografias. Da\u00ed que esses textos revelam ao mesmo tempo meu esfor\u00e7o em juntar essas duas pontas, indiv\u00edduo e cultura, e minhas tentativas de abrir espa\u00e7o para uma reflex\u00e3o sobre o Brasil, menos aprior\u00edstica e mais atenta a processos e atores\u201d[14]<\/a>. Todos os depoimentos s\u00e3o de 2006; ser\u00e1 que os autores dariam os mesmos depoimentos quatro anos depois?<\/p>\n E um terceiro risco \u2013 este menos perigoso, pois pode ser afastado com uma confiss\u00e3o pessoal do organizador \u2013 seria tomar os artigos aqui publicados como os principais<\/em>. Sem d\u00favida, alguns o s\u00e3o, mas outros s\u00e3o frutos da escolha idiossincr\u00e1tica de quem os selecionou (e que n\u00e3o se envergonhou de incluir um texto da pr\u00f3pria lavra) a partir de uma lista pr\u00e9via de mais de cinquenta artigos. A escolha envolveu tamb\u00e9m a busca de diversidade de abordagem, n\u00famero amplo de autores, diversidade regional etc. Alguns nomes importantes est\u00e3o infelizmente ausentes, mas tal problema poder\u00e1 eventualmente ser sanado com a publica\u00e7\u00e3o de um ou mais volumes, ampliando a colet\u00e2nea dos textos fundamentais sobre a hist\u00f3ria da arquitetura moderna brasileira.<\/p>\n Os artigos selecionados nesta colet\u00e2nea e publicados em dois volumes t\u00eam como datas inicial e final os anos de 1983 e 2002. Transforma\u00e7\u00f5es profundas s\u00e3o vis\u00edveis nesse per\u00edodo. Os livros de refer\u00eancia presentes nos primeiros artigos \u2013 de autores importantes, como Venturi, Rossi, Frampton e Giedion \u2013 s\u00e3o citados em suas vers\u00f5es originais, mas v\u00e3o sendo gradativamente substitu\u00eddos por suas tradu\u00e7\u00f5es para o portugu\u00eas, compartilhando o espa\u00e7o com novos t\u00edtulos e autores. H\u00e1 tamb\u00e9m uma not\u00e1vel modifica\u00e7\u00e3o nas notas de rodap\u00e9, que, em pouca quantidade e imprecisas nos artigos iniciais, v\u00e3o se tornando aos poucos mais coerentes e adequadas, para finalmente se tornarem normatizadas nos artigos finais. Essa evolu\u00e7\u00e3o est\u00e1 em parte descaracterizada nesta edi\u00e7\u00e3o, pois as notas foram em grande parte corrigidas nas imprecis\u00f5es e complementadas em suas omiss\u00f5es. Entre salvaguardar o original e colaborar na pesquisa do leitor atual, optamos pela segunda op\u00e7\u00e3o, afinal o original poder\u00e1 ser consultado a qualquer momento nas boas bibliotecas de arquitetura.<\/p>\n Do ponto de vista da argumenta\u00e7\u00e3o, a necessidade de se criar um \u201ccampo\u201d acaba caracterizando o primeiro momento como a busca das caracter\u00edsticas espec\u00edficas de nossa arquitetura, relacionando suas diferen\u00e7as a partir de determina\u00e7\u00f5es ou princ\u00edpios culturais, psicol\u00f3gicos, est\u00e9ticos, civilizacionais etc. Com a sedimenta\u00e7\u00e3o das primeiras conquistas e o estabelecimento de um espa\u00e7o discursivo devidamente el\u00e1stico para suportar a presen\u00e7a de antagonismos e diferen\u00e7as, as pesquisas e especula\u00e7\u00f5es cr\u00edticas acabam derivando para temas espec\u00edficos \u2013 habita\u00e7\u00e3o coletiva ou novas cidades, por exemplo \u2013 e levantamentos monogr\u00e1ficos \u2013 sobre Paulo Mendes da Rocha, Rino Levi, Gregori Warchavchik etc.<\/p>\n Por fim, h\u00e1 o engajamento de pesquisadores estrangeiros, quebrando a hegemonia inicial quase completa exercida pelos pesquisadores brasileiros, com a not\u00e1vel exce\u00e7\u00e3o de Bruand. Se o interesse de Paul Meurs \u2013 grande entusiasta de nossa arquitetura e dela incans\u00e1vel divulgador na Holanda \u2013 pode ser visto como um fato isolado, o mesmo n\u00e3o se pode dizer do interesse dos investigadores<\/em> argentinos, com a dupla Adri\u00e1n Gorelik e Pancho Liernur \u00e0 frente. O n\u00famero 4 da revista Block<\/em> \u00e9 um dos mais importantes documentos sobre a hist\u00f3ria e historiografia da arquitetura moderna brasileira, trazendo contribui\u00e7\u00f5es de pesquisadores brasileiros e argentinos. E n\u00e3o se trata apenas de uma colet\u00e2nea, mas claramente de um di\u00e1logo articulado, como pode se verificar, dentre outros exemplos poss\u00edveis, na tentativa da dupla argentina Fernando Aliata e Claudia Shmidt, que tenta \u201cexplorar a dimens\u00e3o cl\u00e1ssica da teoria e da obra de Lucio Costa a partir da aproxima\u00e7\u00e3o do arquiteto \u00e0 obra de Perret, evidenciada com clareza no conjunto de Monlevade\u201d[15]<\/a>. Essa entrada anal\u00edtica \u2013 de compreender a arquitetura e teoria de Lucio Costa a partir de sua forma\u00e7\u00e3o acad\u00eamica \u2013 j\u00e1 vinha sendo desenvolvida havia alguns anos por Carlos Eduardo Dias Comas, sob a influ\u00eancia do trabalho historiogr\u00e1fico de Colin Rowe. Fato aceito por Aliata e Shmidt que, ap\u00f3s assinalarem que esse aspecto foi, em geral, negligenciado pelos estudiosos de Costa, afirmam que, nesse tipo de abordagem, \u201cexce\u00e7\u00f5es no campo historiogr\u00e1fico constituem-se as an\u00e1lises presentes em Comas\u201d[16]<\/a>. De qualquer forma, esse interesse externo acaba trazendo novamente para a cena a origem da arquitetura moderna no Brasil, que v\u00ea mais uma vez repassada as condi\u00e7\u00f5es de sua implanta\u00e7\u00e3o em nosso pa\u00eds. O distanciamento hist\u00f3rico permite tamb\u00e9m um enfrentamento mais tranquilo de epis\u00f3dios problem\u00e1ticos e amb\u00edguos que foram ignorados ou discutidos com acidez exagerada em outros tempos. Convidamos os leitores a verificarem nos textos originais n\u00e3o s\u00f3 as quest\u00f5es mencionadas nesta breve apresenta\u00e7\u00e3o, mas o quanto j\u00e1 foi realizado em prol da constru\u00e7\u00e3o de uma hist\u00f3ria da arquitetura moderna no Brasil.<\/p>\n [1]<\/a> O presente texto foi originalmente publicado como apresenta\u00e7\u00e3o de uma colet\u00e2nea de artigos publicada em dois volumes: GUERRA, Abilio (org.). Textos fundamentais sobre historia da arquitetura moderna brasileira \u2013 parte 1<\/em>. Cole\u00e7\u00e3o Bolso RG, n.1. S\u00e3o Paulo, Romano Guerra Editora, 2010, 316 p. ISBN: 978-85-88585-22-5 (textos de Carlos Alberto Ferreira Martins, Carlos Eduardo Dias Comas, Lauro Cavalcanti, Luis Espallargas Gimenez, Margareth da Silva Pereira, Renato Anelli, Ruth Verde Zein, Silvana Barbosa Rubino e Sophia S. Telles); GUERRA, Abilio (org.). Textos fundamentais sobre historia da arquitetura moderna brasileira \u2013 parte 2<\/em>. Cole\u00e7\u00e3o Bolso RG, n.2. S\u00e3o Paulo, Romano Guerra Editora, 2010, 332 p. ISBN: 978-85-88585-23-2. (textos de Ab\u00edlio Guerra, Carlos Alberto Ferreira Martins, Carlos Eduardo Dias Comas, Claudia Shmidt, Edson Mahfuz, Fernando Aliata, Hugo Segawa, Jorge Czajkowski, Jorge Francisco Liernur, Margareth da Silva Pereira, Maria Beatriz de Camargo Aranha, Nabil Bonduki, Ot\u00edlia Beatriz Fiori Arantes, Paul Meurs e Renato Anelli). Na forma de comunica\u00e7\u00e3o, foi apresentado posteriormente no I Enanparq \u2013 Encontro Nacional da Associa\u00e7\u00e3o Nacional de Pesquisa e P\u00f3s-gradua\u00e7\u00e3o em Arquitetura e Urbanismo (Rio de Janeiro, 2010), na Mesa “Panoramas da Arquitetura Brasileira Moderna e Contempor\u00e2nea”, coordenada por Ruth Verde Zein.<\/p>\n [2]<\/a> GOODWIN, Philip. Brazil Builds.<\/em> Architecture New and Old 1652-1942<\/em>. Fotos de George E. Kidder Smith. Nova York, MoMA, 1943.<\/p>\n [3]<\/a> MINDLIN, Henrique E. Modern Architecture in Brazil<\/em>. Pref\u00e1cio de Sigfried Giedion. Rio de Janeiro, Colibris, 1956, p. 199. (Vers\u00e3o brasileira: MINDLIN, Henrique E. Arquitetura moderna no Brasil<\/em>. Tradu\u00e7\u00e3o de Paulo Pedreira. Pref\u00e1cio de S. Giedion. Apresenta\u00e7\u00e3o de Lauro Cavalcanti. Aeroplano\/Iphan, Rio de Janeiro, 1999.<\/p>\n [4]<\/a> BRUAND, Yves. Arquitetura contempor\u00e2nea no Brasil<\/em>. S\u00e3o Paulo, Perspectiva, 1981.<\/p>\n [5]<\/a> Na verdade, o curso de mestrado em arquitetura mais antigo do pa\u00eds \u00e9 o da UnB, mas a consolida\u00e7\u00e3o da \u00e1rea de hist\u00f3ria \u00e9 tardia, com praticamente todos seus professores se p\u00f3s-graduando na USP.<\/p>\n [6]<\/a> SEGAWA, Hugo; CREMA, Adriana; GAVA, Maristela. Revistas de arquitetura, urbanismo, paisagismo e design: a diverg\u00eancia de perspectivas. Arquitextos<\/em>, S\u00e3o Paulo, n. 057, texto especial 282, Portal Vitruvius, fev. 2006. <www.vitruvius.com.br\/arquitextos\/arq000\/esp282.asp>.<\/p>\n [7]<\/a> Os tr\u00eas arquitetos migraram posteriormente para a academia, onde ocupam hoje posi\u00e7\u00e3o de destaque na USP, caso de Hugo Segawa, e no Mackenzie, caso de Ruth Verde Zein e Cec\u00edlia Rodrigues dos Santos. Esta \u00faltima \u00e9 coautora de um dos mais importantes livros da historiografia da arquitetura moderna brasileira: SANTOS, Cec\u00edlia Rodrigues dos; PEREIRA, Margareth da Silva; CALDEIRA, Vasco; PEREIRA, Rom\u00e3o Veriano da Silva. Le Corbusier e o Brasil<\/em>. S\u00e3o Paulo, Tessela\/Projeto, 1987.<\/p>\n [8]<\/a> O curso de gradua\u00e7\u00e3o em arquitetura na PUC-Rio s\u00f3 foi inaugurado no ano 2002.<\/p>\n [9]<\/a> A revista \u00d3culum<\/em> n. 1, publicada em 1985, foi uma iniciativa aut\u00f4noma de um grupo de estudantes e rec\u00e9m-formados, todos da PUC-Campinas. A partir do n. 2, de 1992, a revista torna-se revista institucional da escola. A professora Margareth da Silva Pereira, membro da revista G\u00e1vea<\/em> nos anos 1980, participa de forma muito efetiva desse momento especial da escola de Campinas.<\/p>\n [10]<\/a> Sobre a amplitude dos trabalhos monogr\u00e1ficos realizados nos programas de p\u00f3s-gradua\u00e7\u00e3o, ver GUERRA, Abilio. Monografia sobre Salvador Candia e a necessidade de um di\u00e1logo acad\u00eamico. Resenhas Online<\/em>, S\u00e3o Paulo, vol. 78, ano 7. Portal Vitruvius, jun. 2008, p. 208 <www.vitruvius.com.br\/resenhas\/textos\/resenha208.asp>.<\/p>\n [11]<\/a> COSTA, Lucio. Carta-depoimento (1948). In XAVIER, Alberto (org.). Lucio Costa: sobre arquitetura<\/em>. Textos de Lucio Costa. Porto Alegre, Centro dos Estudantes Universit\u00e1rios de Arquitetura, 1962, p. 125.<\/p>\n [12]<\/a> TELLES, Sophia S. Depoimento por email, 09 out. 2006.<\/p>\n [13]<\/a> COMAS, Carlos Eduardo Dias. Depoimento por email, 23 set. 2006.<\/p>\n [14]<\/a> PEREIRA, Margareth da Silva. Depoimento por email, 11 set. 2006.<\/p>\n [15]<\/a> ALIATA, Fernando. Depoimento por email, 09 ago. 2006.<\/p>\n
\nnotas<\/h3>\n